LIÇÕES DA TENTATIVA DE TRAVESSIA DA ANTÁRDIDA POR ERNEST SHACKLETON
De férias em Oslo (Noruega), é impossível não parar para pensar na "Disneyland" dos Pinguins, a Antártida. É que, na terra dos Vikings, há diversos museus prolíficos em histórias de indivíduos que aspiraram desbravar esse parque de diversões de gelo. O principal é o "The Fram Museum", onde está o navio de nome "Fram" que foi usado por Roald Amundsen na sua expedição que ineditamente conseguiu alcançar o continente do gelo.
Um outro personagem, porém, me chamou a atenção no meio desses desbravadores do gelo. Enquanto o Planeta ardia sob o incêndio da primeira Guerra Mundial, um ousado irlandês - Ernest Shackleton - liderou um grupo de valentes que atenderam ao seguinte anúncio publicado na Irlanda em 1914:
- “procuram-se homens para jornada perigosa, salário baixo, frio cortante, retorno seguro duvidoso”.
Houve mais de 5.000 candidatos, mas somente 27 foram selecionados. O convite era para atravessar a Antártida pela primeira vez na história e ir no ponto central do eixo de rotação da Terra no lado sul.
A Antártida já havia sido fincada ineditamente com a bandeira da Noruega por Roald Amundsen em DEZ/1911. A Noruega havia vencido a corrida em relação à Inglaterra, que infelizmente pranteou ao ver o seu representante, o capitão Robert Scott, morrer pela violência do frio, do cansaço e da fome após tentar retornar da sua tardia chegada ao continente meridional do gelo.
Shackleton queria ir além do viking Amundsen: pretendia passar atravessar a Antártida e ser o primeiro homem a estar no centro do eixo sul de rotação da terra.
Não conseguiu essa proeza, mas alcançou outras.
Uma delas foi conseguir, após o gelo ter destroçado o seu imponente navio chamado "Endurance" (persistência, em inglês), ter mantido um espírito de liderança fantástica com a capacidade de imunizar a sua equipe diante da doença do pessimismo. Shackleton foi chamado, por um de seus amigos, como o maior otimista vivo da época. A lealdade de Shackleton a seus amigos era notável. Além de abster-se do sono para protegê-los, abria mão de alimentos para confortá-los. A lealdade, a coragem e o otimismo do líder irlandês acendeu uma chama que não permitia o frio externo ir além da epiderme dos seus confiantes homens.
A outra foi navegar, em um improvisado bote salva-vida, por 17 dias, da ilha Elefante até a ilha Geórgia do Sul, na qual conseguiu, após vencer a dura jornada de travessia dessa ilha ainda não cartografada, o socorro e, com apoio do governo chileno, resgatou todos os demais membros de sua equipe que estavam bravamente vivos à base da limitada alimentação de pinguins e focas e ao fogo implacável da esperança acendida pelo heróico irlandês Shackleton.
Shackleton pode não ter conseguido atravessar a Antártida, mas certamente logrou dar um exemplo convincente de que o temor inspirado pelo perigo, pela incerteza e pelo baixo retorno financeiro de uma jornada duvidosa sob o frio cortante soprado pela vida não é capaz de superar aqueles que cultivam a lealdade, o respeito ao próximo e a coragem. A sociedade contemporânea não pode deixar essas virtudes se congelarem.
Oslo, inverno de 2017.
Carlos E Elias
Obs.: a quem possa interessar, indico este documentário: https://www.youtube.com/watch?v=64XIK5_jy4A.