Breves reflexões críticas à união estável
Carlos E. Elias de Oliveira
Data: 02/09/2021.
A união estável é necessária atualmente no Brasil para evitar injustiças. Todavia, o ideal é caminharmos para uma mudança de cultura de informalidade com a consequente extinção dessa figura, que possui efeitos colaterais à segurança jurídica.
Explica-se.
A cultura brasileira anda pari passu com a informalidade, conforme noticiam vários estudiosos, a exemplo das lições dos clássicos intérpretes weberianos Raymundo Faoro, Vianna Moog e Sérgio Buarque de Holanda, o que gera inevitáveis repercussões no Direito Brasileiro.
A união estável, como uma espécie de família informal, coaduna com essa cultura. Não a admitir no Brasil geraria injustiça contra inúmeros arranjos informais de casais.
Ademais, há outros fatores que colaboram para a multiplicação da união estável no Brasil, como (1) o excesso de formalidades jurídicas exigidas para a celebração e a dissolução do casamento; (2) o costume de preparar as finanças para custear cerimônias nupciais; e (3) a intenção astuta de manter uma relação informal para esquivar-se de credores.
Apesar de estar em consonância com a cultura brasileira, a união estável não é saudável por gerar inseguranças jurídicas, com reflexos negativos na economia, na política e na sociedade. Além de prejudicar terceiros de boa-fé com a ocultação do patrimônio no nome do companheiro, a união estável chega a surpreender até mesmo os próprios companheiros, que, achando-se estar em um mero namoro, ficam vulneráveis após o fim da convivência com a eventual propositura de uma ação de reconhecimento e dissolução da união estável. É notório que o processo judicial, por buscar uma verdade meramente formal – extraída das provas constantes dos autos –, amiúde deságua em decisões contrárias à verdade real. Além do mais, mesmo programas sociais ficam vulneráveis. É comum pessoas serem beneficiadas com programas sociais destinados a baixa renda afirmando ser solteiras quando, na verdade, vivem em união estável com pessoas de alta renda.
É preciso, no entanto, respeitar as particularidades brasileiras, de modo que, apesar da insegurança jurídica causada pela união estável, esta ainda precisa subsistir no Direito Brasileiro enquanto não sobrevier mudança na base cultural nacional e enquanto os entraves burocráticos à realização e à dissolução do casamento forem eliminados.
Em países sem essa forte cultura brasileira de informalidade, a união estável não é admitida como entidade de direito de família, como na Alemanha e na Inglaterra. Em Portugal, embora se admita a união de fato como uma espécie de união estável, a legislação assegura pouquíssimos direitos ao companheiro.
A propósito, na Alemanha, entre 2001 e 2017, foi admitida a união estável registrada (“registered civil paternership”), que nada tinha da união estável brasileira por só ser admitida para casal homoafetivo e por necessariamente depender de um ato formal para se constituir. Em 2017, como o casamento homoafetivo passou a ser admitido, perdeu o sentido a “união estável registrada”.
Enfim, a união estável é instituto necessário no Brasil por conta de sua cultura de informalidade. Convém, porém, refletirmos sobre meios para alterar essa cultura de informalidade e para, ao final, podermos revogarmos essa figura.