domingo, 29 de setembro de 2013

Sobrenome do padrasto e exclusão do sobrenome do pai ausente? Sim (STJ)


NOME. Alteração. Patronímico do padrasto.
O nome pode ser alterado mesmo depois de esgotado o prazo de um ano, contado da maioridade, desde que presente razão suficiente para excepcionar a regra temporal prevista no art. 56 da Lei 6.015/73, assim reconhecido em sentença (art. 57). Caracteriza essa hipótese o fato de a pessoa ter sido criada desde tenra idade pelo padrasto, querendo por isso se apresentar com o mesmo nome usado pela mãe e pelo marido dela.
Recurso não conhecido.
(REsp 220.059/SP, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/11/2000, DJ 12/02/2001, p. 92)
 CIVIL. REGISTRO PUBLICO. NOME CIVIL. PRENOME. RETIFICAÇÃO.
POSSIBILIDADE. MOTIVAÇÃO SUFICIENTE. PERMISSÃO LEGAL. LEI 6.015/1973, ART. 57. HERMENEUTICA. EVOLUÇÃO DA DOUTRINA E DA JURISPRUDENCIA. RECURSO PROVIDO.
I  - O NOME PODE SER MODIFICADO DESDE QUE MOTIVADAMENTE JUSTIFICADO.
NO CASO, ALEM DO ABANDONO PELO PAI, O AUTOR SEMPRE FOI CONHECIDO POR OUTRO PATRONIMICO.
II - A JURISPRUDENCIA, COMO REGISTROU BENEDITO SILVERIO RIBEIRO, AO BUSCAR A CORRETA INTELIGENCIA DA LEI, AFINADA COM A "LOGICA DO RAZOAVEL", TEM SIDO SENSIVEL AO ENTENDIMENTO DE QUE O QUE SE PRETENDE COM O NOME CIVIL E A REAL INDIVIDUALIZAÇÃO DA PESSOA PERANTE A FAMILIA E A SOCIEDADE.
(REsp
 66643/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 21/10/1997, DJ 09/12/1997, p. 64707)

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Comentários a importante questão CESPE: vigência da lei. Considerações sobre vigência, vigor, eficácia da lei.

(Cespe/TCU/Auditor Federal de Controle Externo/2011)
 
A vigência, uma qualidade da lei, diz respeito a sua eficácia temporal.



 O gabarito oficial é CERTO.
 Vigência é a qualidade atribuída à lei de ser eficaz. É qualidade da lei, no sentido de ser uma característica da lei que já obriga os destinatários. 
  A vigência relaciona-se ao tempo de duracao da norma (a sua eficacia temporal). Aproveitemos para trazer a lume considerações de alguns doutrinares acerca das expressões validade, vigência, vigor e eficácia da lei.

VIGÊNCIA

a) "vigência significa a qualidade daquilo que é vigente, dizendo respeito ao lapso temporal no qual a norma legal tem vigor, vinculatividade. Em palavras simples: a vigência da norma corresponde à força obrigatória, vinculante, a ela conferida" (ROSENVALD, Nelson. Direito Civil: Teoria Geral. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 90).
 
VIGÊNCIA E VALIDADE
 
b) "Releva chamar a atenção para não se confundir a vigência da norma jurídica com a sua validade. A validade formal da norma concerne à elaboração pelo órgão competente e com respeito aos procedimentos legais, como exempli gratia, o quórum de aprovação. Já a sua validade material, também chamada de validade constitucional, está correlacionada com a necessidade de conformação (adequação) de cada norma com o ordenamento jurídica, em especial com o Texto Constitucional. Enfim, é a qualidade (adjetivação) reconhecida a uma norma que foi elaborada em harmonia com a Lex Legum, mas ainda não vincular o comportamento geral e abstrato das pessoas" (ROSENVALD, Nelson. Direito Civil: Teoria Geral. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 90).
 
c) "Terminado o processo de sua produção, a norma já é válida. A vigência se inicia com a publicação e se estende até sua revogação, ou até o prazo estabelecido para a sua validade [aqui, o autor não está empregando validade no seu sentido técnico de compatibilidade com o ordenamento jurídico]. A vigência, portanto, é uma qualidade temporal da norma: o prazo com que se delimita o seu período de validade [novamente sem o sentido técnico]. Em sentido estrito, vigência designa a existência específica da norma em determinada época, podendo ser invocada para produzir, concretamente, efeitos, ou seja, para que tenha eficácia" (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 1. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 59).
 
VIGÊNCIA, VIGOR E EFICÁCIA DA NORMA
 
d) A nosso sentir, a LINDB não faz distingue "vigor" de "vigência", a exemplo do seu art. 2º da LINDB, que reza: "Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor [ou seja, terá vigência, sinônimo] até que outra a modifique ou a revogue".
  Mas a doutrina distingue os conceitos, como Tércio Sampaio Ferraz e Carlos Roberto Gonçalves.
 
    É certo, pois, que o termo vigência está relacionado ao tempo de duração da lei, ao passo que vigor está relacionado à sua força vinculante. É o caso, como assinala Fábio de Oliveira Azevedo, do Código Civil de 1916, "que não tem mais vigência, por estar revogado, embora ainda possua vigor. Se um contrato foi celebrado durante sua vigência e tiver que ser examinado hoje, deverá ser aplicado o Código revogado (art. 2.035 do CC/02, na sua primeira parte). Isso significa aplicar uma lei sem vigência (revogada), mas ainda com vigor (determinado pelo art. 2.035)" (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 1. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 59).
 
  Pablo Stolze caminha no mesmo sentido:
 
    Vigência, por sua vez, é um critério puramente temporal.
    Refere-se, precisamente, ao período de validade da norma, ou seja, o lapso temporal que vai do momento em que ela passa a ter força vinculante até a data em que é revogada ou em que se esgota o prazo prescrito para sua duração (no caso de normas temporárias). (...).
    (...)
    Por fim, o vigor (também chamado de "força da norma") diz respeito à força vinculante da norma, ou seja, à impossibilidade de os sujeitos subtraírem-se ao seu império.
    Não se confunde nem com a vigência nem com a eficácia, pelo fato de que, no vigor, o que se verifica é a realização efetiva de resultados jurídicos. Assim, uma norma já revogada (ou seja, não mais vigente) pode continuar sendo aplicada em juízo, se disser respeito a situações consolidadas sob a sua vigência, fenômeno que se denomina ultratividade.
(STOLZE, Pablo. Novo curso de direito civil, volume I: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2011)
  
   A nosso sentir, não parece haver utilidade na distinção. Talvez por isso a LINDB tomou vigor como sinônimo de vigência. O art. 2º da LINDB toma as expressões como equivalentes. No caso de ultratividade, a lei, mesmo revogada, continua disciplinando atos ocorridos sob seu período de vigência ou de vigor. É disso que trata a primeira parte do art. 2.035 ("A validade dos negócios jurídicos e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores ..."). O Código Civil de 1916 não tem mais vigência (ou seja, não tem mais vigor) para atos ocorridos posteriormente à sua revogação. E não nos deitaremos sobre a discussão que existe sobre a eventual inconstitucionalidade da segunda parte do art. 2.035 do CC, que insinua imprimir uma vedada retroatividade mínima ao novo Código, conforme este artigo da Ministra Nancy Andrighi: ANDRIGHI, Fátima Nancy. A constitucionalidade do art. 2.035 do Código Civil. Artigo disponível no site bdjur.stj.gov.br em 24.08.2011.Leia mais: http://jus.com.br/artigos/20794/a-constitucionalidade-e-a-retroatividade-do-art-2-035-paragrafo-unico-do-codigo-civil#ixzz2g7eo22n3.
 
 
e) A doutrina distingue "vigência" ou "vigor" de "eficácia" da lei. Anota Carlos Roberto Gonçalves:
 
    Registre-se que o vigor e a vigência não se confundem com a eficácia da lei. Esta é uma qualidade da norma que se refere à sua adequação em vista da produção concreta de efeitos  (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 1. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 59).
 
 Igualmente, Pablo Stolze:
 
    Já a eficácia é a qualidade da norma que se refere à aptidão para a produção concreta de efeitos.
    Do ponto de vista teórico, a eficácia pode ser:
    a) social: produção concreta de efeitos, porque presentes as condições fáticas exigíveis para seu cumprimento.
    Uma norma, por exemplo, que estabelecesse a utilização obrigatória de determinado equipamento de segurança inexistente no mercado (e sem previsão de produção) seria uma norma sem qualquer eficácia social.
    Não se deve confundir, porém, essa forma de eficácia com sua observância, porque sempre será possível, enquanto vigente, sua imposição coercitiva pelo Judiciário. É o caso, por exemplo, da obrigatoriedade do uso de cinto de segurança, constante do Código de Trânsito Brasileiro (Lei n. 9.503, de 23-9-1997): mesmo não havendo hábito de utilização do referido equipamento em algumas regiões do Brasil, isso não será justificativa para o perdão de multas eventualmente impostas.
    b) Técnica: produção de efeitos, porque presentes as condições técnico-normativas exigíveis para sua aplicação.
    A previsão de "relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos da lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos", contida no inciso I do art. 7º da CF/88, pode ser considerada um típico exemplo de norma, por si só, sem eficácia técnica, tendo em vista a inexistência, até o momento, da referida lei complementar. Registre-se, outrossim, o fato de que toda norma constitucional possui eficácia jurídica lato sensu, razão pela qual a legislação complementar ou ordinária - existente ou que venha a ser criada - não poderá contrariá-la, sob o argumento de ainda estar pendente dire regulamentação.
    Não compactuamos com essa distinção. Os termos devem ser tomados como sinônimos do ponto de vista técnico, pois dizer que a "lei estar em vigor" é o mesmo que afirmar que ela "está em vigência" ou que "possui eficácia". Ao entrar em vigor (vigência ou eficácia), a lei produz efeitos e obriga os seus destinatários. Írrita é qualquer distinção terminológica.
 
 
f)    Apesar de nosso entendimento pessoal, a doutrina majoritária inclina-se por apartar, uns dos outros, os conceitos de eficácia, vigor e vigência. Dessa forma, em concursos públicos, recomendamos que os candidatos somente considerem esses conceitos como sinônimos se o examinador, na formulação da questão, não deixar qualquer indício de que pretende efetivamente diferenciar os termos. Por exemplo, o próprio Carlos Roberto Gonçalves, embora distinga as expressões, mencionou a expressão "validade" de modo atécnico, conforme exposto no item "c" acima.

terça-feira, 24 de setembro de 2013

vc sabe o que é responsabilidade pressuposta?


1)                 Responsabilidade pressuposta.

a.      A "responsabilidade pressuposta" é um conceito proposto por Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka.

b.      Trata-se de conceito aberto, que ainda depende de regulamentação nos casos concretos pela jurisprudência e a doutrina. Flávio Tartuce, por exemplo, aponta a imprescritibilidade das ações de indenização por torturas na época da ditadura como um exemplo de materialização da responsabilidade pressuposta, pois, enaltecendo a dignidade da pessoa humana, viabiliza o ressarcimento de uma grave violação de um direito fundamental[1]. Essa situação, acatada pelo STJ, cristaliza também o movimento de constitucionalização do direito civil, ao reconhecer que "a responsabilidade civil deve ser encarada no ponto de vista da personalização do Direito Privado, ou seja, da valorização da pessoa em detrimento da desvalorização do patrimônio (despatrimonialização)"[2].

c.       A responsabilidade pressuposta consiste em pressupor a responsabilidade de quem, com sua atividade, expõe outras pessoas a risco (mise en danger[3]) e, por isso, deve indenizá-la, ainda que não seja o culpado. A responsabilidade pressuposta seria uma cláusula geral de mise en danger aprimorada. A ideia é a de que, em primeiro lugar, deve-se indenizar a vítima e, depois, buscar-se o reembolso de quem realmente foi o culpado ou o criador da situação de risco. A responsabilidade pressuposta afasta-se da doutrina tradicional por não condicionar a reparação do dano aos pressupostos tradicionais da responsabilidade civil (nexo causal, dano, ato ilícito e culpa). A responsabilidade civil já é pressuposta pelo ordenamento, de modo que o dano apenas torna concreto o dever de indenizar, sem necessidade de prova de culpa. Cuida-se de uma aproximação da responsabilidade civil objetiva.

d.     A responsabilidade pressuposta é "uma otimização da regra constante do art. 927, parágrafo único, do Código Civil"[4].

e.      Em suma, a responsabilidade pressuposta destina-se a evitar que as pessoas sofram danos e a reduzir, ao máximo, o número de vítimas sem ressarcimento. Ela também convida a reparação de danos "antes não ressarcíveis, novas situações existenciais de danos, independentemente da discussão da culpa"[5]. Afinal de contas, o conceito de dano é fluido e dinâmico e está em constante evolução.

f.        A responsabilidade pressuposta, ao prevenir danos e reduzir os casos de vítimas não ressarcidas, coaduna com o princípio da dignidade da pessoa humana.




[1] TARTUCE, Flávio. Direito civi, v. 2: direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013. P. 303.
[2] TARTUCE, Flávio. Direito civi, v. 2: direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013. P. 302.
[3] Expressão francesa que, em tradução livre, significa ameaça ou colocação em perigo.
[4] TARTUCE, Flávio. Direito civi, v. 2: direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013. P. 300.
[5] TARTUCE, Flávio. Direito civi, v. 2: direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013. P. 298.

Questão do CESPE sobre retroatividade das leis


(CESPE - DPF - Delegado/2013) A revogação de uma norma pela superveniência de outra que disponha sobre a mesma matéria poderá atingir as situações já consumadas sob a égide da lei antiga, afetando os efeitos pretéritos produzidos ou incidindo sobre os efeitos presentes ou futuros de situações passadas ocorridas na vigência da norma revogada.


Gabarito oficial: Correto.
Justificativa do CESPE:  O gabarito está de acordo com abalizada doutrina: “A permanência da norma indica que a lei, uma vez promulgada e publicada, obrigará indefinidamente até que venha a ser revogada por outra lei. A revogação de uma norma pela superveniência de outra, regendo a mesma matéria, causa tríplice repercussão na antiga lei, pois poderá atingir as situações já consumadas sob sua égide, afetar os efeitos pretéritos produzidos ou incidir sobre os efeitos presentes ou futuros de situações passadas ocorridas na vigência da norma revogada.” Apesar das argumentações trazidas nas razões recursais, a assertiva faz menção a situações e, não, a ato jurídico e também traz a expressão "poderá". 


Meus comentários


O CESPE manteve o gabarito como correto, argumentando que, na questão, não se estava falando de ato jurídico perfeito (caso em que jamais qualquer nova lei poderia ter retroatividade), mas sim de situação jurídica. Diz, ademais, que a questão fala em "poderá atingir" e não em "deverá atingir", o que demonstraria uma faculdade.

  A bem da verdade, a questão merecia ser anulada. O examinador não quis dar o braço a torcer.

  Seja como for, tentemos elucidar o que estava na mente do examinador (esforço que os candidatos heroicamente precisam fazer durante as provas).

  Lembremos que é admitida a retroatividade de leis, salvo se ela violar os óbices constitucionais (ato jurídico perfeito, coisa julgada e direito adquirido).

  Se violar qualquer desses óbices, a lei não pode retroagir. 

  Assim, quem era servidor público anteriormente à Lei 8.112 será submetido ao regime jurídico dessa nova norma, pois não há direito adquirido a regime jurídico. Nesse caso, a situação jurídica (servidor público) já consumada anteriormente à Lei 8.112 será sujeita à nova norma, pois não há violação a qualquer dos óbices constitucionais.

   Como se vê, a nova norma poderá atingir efeitos futuros ou pretéritos de uma situação jurídica pretérita se não violar qualquer dos óbices constitucionais. O examinador estava querendo cobrar isso. Mas não soube escrever a questão, o que convidava a sua anulação.