quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Corte de energia elétrica e o STJ: breve resumo


(1) Corte de energia elétrica depende de prévia notificação e não pode ocorrer:   


a       a) por débito antigo, mas apenas por conta regular, relativo ao mês de consumo;
         b)  débito por suposta fraude de medidor, apurado unilateralmente pela concessionária de serviço público. Ressalva-se que:

                                               i.     no caso de cobrança de diferenças decorrentes de fraude de medidor, se houver acordo entre as partes, o inadimplemento das prestações desse acordo autoriza o corte da energia elétrica;
                                             ii.     no caso de a cobrança decorrer de processo administrativo em que foi concedida ampla defesa ao consumidor, cabe o corte de energia. Afinal de contas, foi garantido o contraditório. Entendimento contrário seria prestigiar o fraudador em comparação com o mero inadimplente, pois seria o corte de energia elétrica apenas para este último.

c             c) por dívida discutida judicialmente quando proveniente de suposta fraude em medidor de energia, pois configura cobrança vexatória (art. 42 do CDC) suspender o fornecimento de energia a consumidor que pretende discutir judicialmente débito que reputa indevido

  (2) Cabe dano moral pelo corte indevido. Há precedentes do STJ mantendo valores de R$ 10.000,00 e de R$ 30.000,00 com base na Súmula n. 7/STJ.
       
   (3) Vale a pena conferir este resumo feito pelo STJ: http://stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=111721. Transcrevo-o abaixo:

ESPECIAL
A Justiça e o consumidor de olho no fornecimento de energia elétrica
O domínio humano da energia elétrica a partir do século XIX impulsionou o crescimento econômico, dinamizou a vida doméstica, as comunicações, o lazer, o conhecimento... Entre incontáveis efeitos desse avanço tecnológico na sociedade moderna, há também relações jurídicas que continuamente demandam a intervenção dos tribunais.

E são muitos os conflitos que chegam ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) em busca de solução na área de energia elétrica. Algumas ações discutem a responsabilidade das concessionárias por acidentes ou falhas do serviço. Outras tratam da cobrança de tarifas ou do corte no fornecimento.

O STJ, por exemplo, decidiu que o consumidor é parte legítima para contestar cobrança indevida de tributo indireto sobre energia elétrica. Em outra decisão, afirmou que aquele que frauda o medidor de consumo pode ter o serviço suspenso. Em um recurso, decidiu ainda que, sem aviso prévio, o corte de energia por falta de pagamento é ilegal. Confira algumas das decisões importantes nessa área.

Responsabilidade objetiva

Em fevereiro deste ano, a Terceira Turma, por maioria, condenou uma concessionária a pagar indenização por danos morais e materiais à viúva e ao filho de um trabalhador que morreu eletrocutado em 1988 quando fazia a limpeza de uma piscina, com base na responsabilidade objetiva da empresa (REsp 1.095.575).

Devido a um aterro, feito durante a reforma do imóvel, o nível da área da piscina foi elevado e a distância em relação à rede elétrica acabou ficando menor que a recomendada pelas normas de segurança. Ao fazer seu trabalho, a vítima encostou a haste do aparelho de limpeza nos fios de alta tensão e sofreu descarga elétrica fatal.

A mulher e o filho, menor à época do acidente, ajuizaram ação pedindo reparação dos danos materiais e compensação por danos morais. A concessionária alegou falta de culpa pelo ocorrido, bem como a culpa exclusiva da vítima ou dos donos do imóvel.

A Terceira Turma reconheceu a responsabilidade objetiva da concessionária, que não fiscalizou a reforma realizada no imóvel. Ela não teria observado as regras mínimas de segurança estabelecidas pela legislação.

“O risco da atividade de fornecimento de energia elétrica é altíssimo, sendo necessária a manutenção e fiscalização rotineira das instalações, exatamente para que acidentes como aquele que vitimou o marido e pai dos recorrentes sejam evitados”, disse a relatora da matéria, ministra Nancy Andrighi. Para ela, “de nada adianta uma única verificação feita pela concessionária quando da implantação da rede elétrica”.

A ministra assinalou que o Código Civil de 1916, vigente na época do acidente, não tratava expressamente da responsabilidade objetiva em decorrência do risco da atividade, o que só veio a ser feito no código de 2002. Mesmo assim, segundo ela, ainda antes da Constituição de 88 e da entrada em vigor da nova legislação civil, a responsabilidade objetiva das concessionárias de eletricidade já era reconhecida judicialmente, com base no risco da atividade.

Aposentadoria especial

A Primeira Seção decidiu, em recurso repetitivo, que a exposição habitual do trabalhador à energia elétrica pode motivar a aposentadoria especial (REsp 1.306.356).

O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) argumentou em juízo que a exclusão da eletricidade da lista de agentes nocivos, em decreto de 1997, tornaria impossível mantê-la como justificadora do tempo especial para aposentadoria.

O ministro Herman Benjamin, no entanto, sustentou que a interpretação sistemática de leis e normas que regulam os agentes e atividades nocivos ao trabalhador leva a concluir que tais listagens são exemplificativas. Assim, deve ser considerado especial o tempo de atividade permanente e habitual que a técnica médica e a legislação considerem prejudicial ao trabalhador.

O ministro destacou que a jurisprudência já havia fixado esse entendimento na Súmula 198 do Tribunal Federal de Recursos (TFR). Segundo a súmula, "atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em regulamento”.

Corte de energia

Muitas demandas chegam ao STJ discutindo o corte no fornecimento de energia elétrica. Segundo decisão proferida em um recurso, se os usuários inadimplentes não forem previamente avisados sobre o corte de energia, a suspensão do serviço será ilegal.

A Primeira Turma negou recurso apresentado por uma concessionária, que pretendia mudar decisão de segunda instância que restabeleceu o fornecimento de energia de um condomínio com 300 apartamentos, em Maceió, mesmo estando com pagamento em atraso (REsp 1.306.356).

A empresa alegou que o condomínio era devedor frequente, tendo sido, inclusive, condenado em ação de cobrança de débitos. Segundo a empresa, o condomínio teria admitido a condição de devedor ao ingressar com mandado de segurança contra o corte no fornecimento de energia, daí a possibilidade de interrupção no serviço.

Em primeiro grau, o condomínio garantiu o restabelecimento da energia, porque os artigos 22 e 42 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) impediriam a suspensão, por se tratar de fornecimento considerado essencial e de prestação contínua. O Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL) negou o apelo da concessionária, sob o argumento de que os consumidores teriam de ser avisados previamente sobre a suspensão, o que não ocorreu.

No recurso apreciado pelo STJ, o relator, ministro Teori Albino Zavascki, destacou que a regra do CDC não é absoluta. Deve, sim, ser conjugada com a Lei 8.987/95 – a Lei de Concessões, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos. Em seu artigo 6º, a lei possibilita a interrupção após aviso prévio, nos casos de inadimplemento. No entanto, de acordo com o ministro Zavascki, ante a falta do aviso, como no caso julgado, o corte é ilegítimo.

Cobrança de dívida

No que se refere à fraude no medidor, o STJ entende que é possível o corte no fornecimento de energia, mesmo que tenha realizado um acordo, que mais tarde foi descumprido (REsp 806.985).

Em um dos recursos julgados, a concessionária realizou fiscalização na residência da usuária e ingressou na Justiça para cobrar diferenças entre o consumo médio, considerando os aparelhos eletrodomésticos existentes na casa, e os valores efetivamente pagos. A especificidade do processo é que foi feito um acordo com a consumidora, que pagou apenas duas parcelas do ajuste.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) entendeu que a dívida decorria do inadimplemento de acordo acertado para solucionar diferenças a título de recuperação de consumo de “crédito passado”, que nada teria a ver com a relação ordinária da prestação do serviço. Segundo o órgão, o crédito antigo deveria ser recuperado pela via do processo judicial, segundo as regras gerais previamente estabelecidas, não sendo possível o corte de energia do usuário, como se fosse um devedor contumaz.

O ministro João Otávio de Noronha, entretanto, entendeu que não se tratava de mero inadimplemento de contas antigas, como em caso em que é esquecida a cobrança por parte da concessionária. Se esse fosse o caso, no seu ponto de vista, não seria razoável a interrupção do serviço, até porque seria de se supor que a concessionária já haveria absorvido o prejuízo.

O caso dos autos, segundo o ministro, tratava-se de uma fraude, em que a companhia buscou cobrar os valores cabíveis tão logo soube de sua existência. “Assim, visto que não se trata de débitos passados, mas de valores que estavam sendo negociados, entendo que é lícito a concessionária interromper o fornecimento se, após o aviso prévio, o consumidor devedor não solver a dívida oriunda de contas geradas pelo consumo de energia”, disse o ministro.

Noronha destacou que não modifica a conclusão o fato de que não se tratava de simples inadimplência relativa a contas antigas, mas de débitos apurados unilateralmente pela concessionária. “Ora, evidentemente que o consumidor que frauda medidor tem intenção de que o real consumo de energia por ele realizado seja camuflado, com o fim de pagar menos”. Em tais casos, não há dúvida quanto à existência de energia consumida que não foi quitada.

Seria um contrassenso, segundo o ministro, o entendimento de que é permitida a suspensão de energia por consumo ordinário não pago, e de que não é permitida na hipótese de consumo não pago porque a apuração não foi exata em decorrência da camuflagem praticada pelo consumidor.

Apuração unilateral

O STJ tem o entendimento de que, nos casos de irregularidade no medidor, a concessionária deve utilizar os meios ordinários de cobrança para o recebimento da diferença, não a interrupção do fornecimento. Com base nessa jurisprudência, a Segunda Turma rejeitou recurso especial ajuizado por concessionária para reverter decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (REsp 633.722).

A concessionária apresentou prova pericial que constatou irregularidades anteriores na medição do fornecimento. Mas não conseguiu comprovar a existência de fraude no equipamento, que, segundo a concessionária, gerou uma diferença de 33% entre o que foi efetivamente utilizado pelo consumidor e o que ficou registrado no medidor irregular, nos 24 meses anteriores.

Como o consumidor vinha pagando as faturas mensais regularmente, a Justiça fluminense entendeu que o corte seria uma forma de coação para forçar o pagamento de tal diferença, procedimento inadimissível no sistema jurídico.

No recurso ajuizado no STJ, a concessionária sustentou que a falta de pagamento de valores relativos a diferenças apuradas ante a constatação de irregularidades no medidor permite o corte no fornecimento da energia. Acompanhando o voto do relator, ministro Herman Benjamin, a Turma considerou que a concessionária queria utilizar o corte de energia para forçar o consumidor a reconhecer as conclusões técnicas a que ela chegou unilateralmente.

Em seu voto, o relator ressaltou que o caso não envolvia discussão sobre energia ordinariamente fornecida, mesmo porque o consumidor recorrido estava em situação de adimplência, exceto em relação ao período em que a concessionária questionava a medição. Dessa forma, em razão de os débitos serem antigos e contestados pela consumidora, não se aplica a Lei de Concessões.

Por não se tratar de devedor contumaz, a Turma decidiu que a concessionária de serviço público deveria utilizar os meios ordinários de cobrança, não a interrupção do fornecimento para buscar a quitação do débito.

Contestação judicial

Um consumidor de São Paulo garantiu o direito ao fornecimento de energia elétrica enquanto contestava judicialmente um débito, considerado por ele indevido (Ag 697.680). A concessionária apurou unilateralmente uma suposta fraude e, com base em um termo de irregularidade, passou a cobrar do consumidor a diferença entre o que alegava ser o consumo real e o valor pago durante cinco anos, inclusive cortando o serviço.

A Segunda Turma não chegou a analisar o recurso apresentado, que pretendia reformar decisão favorável ao consumidor no Tribunal de Justiça de São Paulo. Mas o relator, ministro Castro Meira, explicou que a interrupção do fornecimento de energia daquele que procura a Justiça para discutir os débitos que considera indevidos é uma forma de constrangimento ilegal.

O ministro destacou haver no STJ entendimento de que é lícito à concessionária interromper o fornecimento se, após aviso prévio, o consumidor permanecer inadimplente no pagamento da conta. No entanto, tornado o débito litigioso, o devedor não poderá sofrer nenhuma retaliação por parte do credor.

Furto de energia

O STJ decidiu em 2010 que a concessionária pode suspender o fornecimento de energia elétrica em caso de fraude devidamente apurada em processo administrativo. O então presidente do STJ, ministro Cesar Asfor Rocha, deferiu parcialmente o pedido apresentado pela companhia e suspendeu liminar de juízo de primeiro grau que impedia o corte no fornecimento antes da realização da perícia técnica por órgão imparcial, seguindo procedimento previsto na Resolução 456/00 da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

A concessionária alegou, no pedido, que, ao prevalecer a liminar da Justiça paulista, haveria completa inversão de valores. Seria mais vantajoso ser fraudador do que apenas inadimplente. O cidadão que fraudasse o medidor de consumo de energia não poderia ter corte no fornecimento por não pagamento da conta de luz. Já aquele que fossse apenas inadimplente teria suspenso o serviço de eletricidade e a religação ficaria condicionada ao pagamento.

Segundo o ministro Cesar Rocha, a impossibilidade de corte no fornecimento para os consumidores inadimplentes e, principalmente, nas hipóteses em que houver fraude, pode ocasionar grave lesão à economia pública. O ministro defendeu que a decisão fosse intermediária a fim de evitar grave lesão à ordem e à economia pública, sem prejudicar o direito de defesa do consumidor acusado de fraude.

Cesar Rocha decidiu pela suspensão de parte da liminar para permitir o corte no fornecimento de energia elétrica na hipótese de não pagamento dos valores resultantes de fraude, apurados em processo administrativo, com direito à ampla defesa do consumidor e dispensada perícia quando não requerida por ele (SLS 1.244).

Dívida pregressa

Segundo o STJ, nos casos em que fica configurada a cobrança de valores não contemporâneos à prévia notificação, não deve haver a suspensão do fornecimento. Foi o que ficou decidido em recurso julgado pela Segunda Turma em processo do Rio Grande do Sul (REsp 865.841).

No caso, a Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) cortou o fornecimento de uma usuária após constatar irregularidades no medidor. O mau funcionamento foi resolvido e a companhia fez uma cobrança com base no maior consumo da usuária em 12 meses.

Conforme posição do Tribunal nesse recurso, o corte de energia pressupõe inadimplemento de conta relativa ao mês do consumo, sendo inviável a suspensão do abastecimento em razão de débitos antigos. Para tais casos, deve a companhia usar dos meios ordinários de cobrança, pois não se admite qualquer espécie de constrangimento ou ameaça ao consumidor.

A concessionária alegou que o corte era possível em função do artigo 6º, parágrafo 3º, da Lei de Concessões. Esse artigo obriga que as empresas forneçam serviço contínuo e adequado aos usuários, podendo interrompê-lo em caso de emergência ou inadimplemento, após aviso prévio.

O ministro Humberto Martins, relator da matéria no STJ, considerou que, apesar de a Primeira Turma ter considerado lícito a empresa interromper o fornecimento mediante aviso prévio em caso de inadimplemento, isso não se aplica a casos em que há cobrança de débitos pretéritos.

O ministro observou que o CDC se aplica aos serviços públicos prestados por concessionárias e que o artigo 42 prevê que só podem ser usados meios ordinários de cobrança, não se admitindo constrangimento ou ameaça aos usuários.

Ele citou a jurisprudência do Tribunal segundo a qual só se admite a suspensão do fornecimento no caso de débitos relativos ao mês de consumo e em contas regulares. Como haveria diferença da tarifa habitual devido ao “ressarcimento” dos meses quando o medidor não funcionava adequadamente, o fornecimento não poderia ter sido suspenso.

Tributo sobre energia

O STJ garantiu o direito de o consumidor reclamar judicialmente dos aumentos no preço de energia elétrica, em decorrência de práticas tributárias adotadas pelo governo.

Segundo decisão da Primeira Seção, no julgamento de um recurso do Rio Grande do Sul, qualquer excesso fiscal imposto à concessionária é repassado automaticamente ao consumidor final em caso de serviço essencial explorado em regime de monopólio. Por isso, ele é o único interessado em contestar a cobrança indevida de tributo (REsp 1.278.688).

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a legitimidade de uma empresa, consumidora final de energia elétrica, para impugnar a cobrança de imposto sobre a demanda contratada em vez da efetivamente fornecida. No caso julgado em regime de repetitivo, tratava-se de distribuidora de bebida que pretendia restituição de imposto recolhido pela fabricante.

A Seção entendeu que a concessionária de energia posiciona-se ao lado do estado, no mesmo polo da relação, já que o repasse vai para o consumidor final. A posição da concessionária é “absolutamente cômoda e sem desavenças, inviabilizando qualquer litígio”, já que a lei impõe a majoração da tarifa nessas hipóteses, para manter o equilíbrio econômico-financeiro da concessão – afirmou o ministro Cesar Asfor Rocha, em voto-vista apresentado na Seção.

“O consumidor da energia elétrica, observada a relação paradisíaca concedente/concessionária, fica relegado e totalmente prejudicado e desprotegido”, afirmou o ministro.

De acordo com o relator desse recurso, ministro Herman Benjamin, a concessionária atua mais como substituto tributário no caso, sem interesse em resistir à exigência ilegítima do fisco, do que como consumidor de direito. “Inadmitir a legitimidade ativa processual em favor do único interessado em impugnar a cobrança ilegítima de um tributo é o mesmo que denegar acesso ao Judiciário em face de violação ao direito”, concluiu.

Energia não consumida

A Primeira Seção do STJ decidiu, também em repetitivo, que o consumidor possui legitimidade para contestar a cobrança de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no caso de energia elétrica que, apesar de contratada, não foi efetivamente fornecida.

Os ministros rejeitaram o argumento do fisco de que o destinatário final da energia não integra a relação tributária, já que não arca diretamente com os custos do imposto. Para o ministro Cesar Rocha, esse entendimento é perverso quando aplicado aos serviços de concessionárias públicas.

“Sem dúvida alguma, sobretudo no tocante à cobrança, ao cálculo e à majoração dos tributos – à exceção do Imposto de Renda –, o poder concedente e a concessionária encontram-se, na verdade, lado a lado, ausente qualquer possibilidade de conflito de interesses”, sustentou.

O ministro explicou que, nas hipóteses de mudança nos tributos, a lei protege a concessionária, obrigando a revisão dos valores de tarifas a fim de preservar o equilíbrio econômico-financeiro do contrato. “Sob esse enfoque é que o estado-concedente e a concessionária do serviço público encontram-se lado a lado, no mesmo polo, em situação absolutamente cômoda e sem desavenças, inviabilizando qualquer litígio em casos como o presente”, anotou. 




quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Comentários a esta questão (CESPE): O único bem imóvel residencial do devedor é penhorável, desde que esteja desocupado.

TRT10 - 2013 - No que concerne ao direito de família e ao direito das sucessões, julgue os itens subsequentes.

O único bem imóvel residencial do devedor é penhorável, desde que esteja desocupado.

Gabarito: Certo.

Se o imóvel está desocupado, mas está sendo aproveitado pela família (que, por exemplo, aluga-o e, com os rendimentos, sustenta-se), há impenhorabilidade.
Se, porém, o imóvel desocupado está sem uso algum, o bem é penhorável.
É essa a leitura dos precedentes do STJ acerca da Lei nº 8.009/90:

PROCESSO CIVIL. AGRAVO NO RECURSO ESPECIAL. IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. IMÓVEL DESOCUPADO.
- A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que o fato de a entidade familiar não utilizar o único imóvel como residência não o descaracteriza automaticamente, sendo suficiente à proteção legal que seja utilizado em proveito da família, como a locação para garantir a subsistência da entidade familiar.
- Neste processo, todavia, o único imóvel do devedor encontra-se desocupado e, portanto, não há como conceder a esse a proteção legal da impenhorabilidade do bem de família, nos termos do art. 1º da Lei 8.009/90, pois não se destina a garantir a moradia familiar ou a subsistência da família. Precedentes.
- Agravo no recurso especial não provido.
(AgRg no REsp 1232070/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/10/2012, DJe 15/10/2012)

CIVIL E PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO. AUSÊNCIA. SÚMULA 284/STF. BEM DE FAMÍLIA. IMÓVEL DESOCUPADO, MAS AFETADO À SUBSISTÊNCIA DOS DEVEDORES.
IMPENHORABILIDADE. DESNECESSIDADE DE PROVAR A INEXISTÊNCIA DE OUTROS BENS IMÓVEIS. ART. ANALISADO: 5º DA LEI 8.009/1990.
1. Embargos à execução distribuídos em 04/12/2006, dos quais foi extraído o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 15/08/2013.
2. A controvérsia cinge-se a decidir se o imóvel dos recorrentes constitui bem de família.
3. Não se conhece do recurso especial quando ausente a indicação expressa do dispositivo legal violado.
4. A regra inserta no art. 5º da Lei 8.009/1990, por se tratar de garantia do patrimônio mínimo para uma vida digna, deve alcançar toda e qualquer situação em que o imóvel, ocupado ou não, esteja concretamente afetado à subsistência da pessoa ou da entidade familiar.
5. A permanência, à que alude o referido dispositivo legal, tem o sentido de moradia duradoura, definitiva e estável, de modo a excluir daquela proteção os bens que são utilizados apenas eventualmente, ou para mero deleite, porque, assim sendo, se desvinculam, em absoluto, dos fins perseguidos pela norma.
6. Como a ninguém é dado fazer o impossível (nemo tenetur ad impossibilia), não há como exigir dos devedores a prova de que só possuem um único imóvel, ou melhor, de que não possuem qualquer outro, na medida em que, para tanto, teriam eles que requerer a expedição de certidão em todos os cartórios de registro de imóveis do país, porquanto não há uma só base de dados.
7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.

(REsp 1400342/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/10/2013, DJe 15/10/2013)

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

STJ condena TIM a dano moral coletivo (R$ 400.000,00) por venda casada (celular + plano vantajoso)

       STJ manteve condenação da TIM a pagar R$ 400.000,00 de dano moral coletivo por venda casada, ao condicionar a concessão de um preço extremamente vantajoso pelo serviço de telefonia móvel à aquisição de um aparelho celular:


ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. OMISSÃO INEXISTENTE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO DO CONSUMIDOR.
TELEFONIA. VENDA CASADA. SERVIÇO E APARELHO. OCORRÊNCIA. DANO MORAL COLETIVO. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
1. Trata-se de ação civil pública apresentada ao fundamento de que a empresa de telefonia estaria efetuando venda casada, consistente em impor a aquisição de aparelho telefônico aos consumidores que demonstrassem interesse em adquirir o serviço de telefonia.
2. Inexiste violação ao art. 535, II do CPC, especialmente porque o Tribunal a quo apreciou a demanda de forma clara e precisa e as questões de fato e de direito invocadas foram expressamente abordadas, estando bem delineados os motivos e fundamentos que a embasam, notadamente no que concerne a alegação de falta de interesse de agir do Ministério Público de Minas Gerais.
3. É cediço que a marcha processual é orquestrada por uma cadeia concatenada de atos dirigidos a um fim. Na distribuição da atividade probatória, o julgador de primeiro grau procedeu à instrução do feito de forma a garantir a ambos litigantes igual paridade de armas. Contudo, apenas o autor da Ação Civil Pública foi capaz de provar os fatos alegados na exordial.
4. O art. 333 do Código de Processo Civil prevê uma distribuição estática das regras inerentes à produção de prova. Cabe ao réu o ônus da impugnação específica, não só da existência de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor, como também da impropriedade dos elementos probatórios carreados aos autos pela ex adversa. Nesse ponto, mantendo-se silente o ora recorrido, correto o entendimento de origem, no ponto em que determinou a incidência do art. 334, II, do CPC e por consequência, ter recebido os documentos de provas do autor como incontroversos.
5. O fato de ter as instâncias de origem desconsiderado a prova testemunhal da recorrida - porquanto ouvida na qualidade de informante - não está apto a configurar cerceamento de defesa, pois a própria dicção do art. 405, § 4º, do CPC, permite ao magistrado atribuir a esse testemunho o valor que possa merecer, podendo, até mesmo, não lhe atribuir qualquer valor.
6. Não tendo o autor sido capaz de trazer aos autos provas concretas de sua escorreita conduta comercial, deve suportar as consequências desfavoráveis à sua inércia. Fica, pois, afastado possível violação aos arts. 267, VI, 333, II e 334, II do CPC.
7. A possibilidade de indenização por dano moral está prevista no art. 5º, inciso V, da Constituição Federal, não havendo restrição da violação à esfera individual. A evolução da sociedade e da legislação têm levado a doutrina e a jurisprudência a entender que, quando são atingidos valores e interesses fundamentais de um grupo, não há como negar a essa coletividade a defesa do seu patrimônio imaterial.
8. O dano moral coletivo é a lesão na esfera moral de uma comunidade, isto é, a violação de direito transindividual de ordem coletiva, valores de uma sociedade atingidos do ponto de vista jurídico, de forma a envolver não apenas a dor psíquica, mas qualquer abalo negativo à moral da coletividade, pois o dano é, na verdade, apenas a consequência da lesão à esfera extrapatrimonial de uma pessoa.
9. Há vários julgados desta Corte Superior de Justiça no sentido do cabimento da condenação por danos morais coletivos em sede de ação civil pública. Precedentes: EDcl no AgRg no AgRg no REsp 1440847/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/10/2014, DJe 15/10/2014, REsp 1269494/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/09/2013, DJe 01/10/2013; REsp 1367923/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/08/2013, DJe 06/09/2013; REsp 1197654/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/03/2011, DJe 08/03/2012.
10. Esta Corte já se manifestou no sentido de que "não é qualquer atentado aos interesses dos consumidores que pode acarretar dano moral difuso, que dê ensanchas à responsabilidade civil. Ou seja, nem todo ato ilícito se revela como afronta aos valores de uma comunidade. Nessa medida, é preciso que o fato transgressor seja de razoável significância e desborde os limites da tolerabilidade. Ele deve ser grave o suficiente para produzir verdadeiros sofrimentos, intranquilidade social e alterações relevantes na ordem extrapatrimonial coletiva. (REsp 1.221.756/RJ, Rel. Min. MASSAMI UYEDA, DJe 10.02.2012).
11. A prática de venda casada por parte de operadora de telefonia é capaz de romper com os limites da tolerância. No momento em que oferece ao consumidor produto com significativas vantagens - no caso, o comércio de linha telefônica com valores mais interessantes do que a de seus concorrentes - e de outro, impõe-lhe a obrigação de aquisição de um aparelho telefônico por ela comercializado, realiza prática comercial apta a causar sensação de repulsa coletiva a ato intolerável, tanto intolerável que encontra proibição expressa em lei.
12. Afastar, da espécie, o dano moral difuso, é fazer tabula rasa da proibição elencada no art. 39, I, do CDC e, por via reflexa, legitimar práticas comerciais que afrontem os mais basilares direitos do consumidor.
13. Recurso especial a que se nega provimento.

(REsp 1397870/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/12/2014, DJe 10/12/2014)

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

O que é dano social?

   Amigos, compartilho algumas anotações sobre o dano social. Elas são acríticas; limita-se a descrever o que a doutrina e a jurisprudência têm abordado.
 O tema ainda não é pacífico.
Abraços
Carlos E Elias de Oliveira

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                                                Danos sociais
1.       O art. 6º, VI, do CDC menciona expressamente os danos sociais.
2.    Conceito proposto por Antonio Junqueira de Azevedo, o dano social é uma nova modalidade de dano indenizável, que, apesar de sua proximidade com o dano moral coletivo, dele se distingue pelo fato de este último só se referir a danos "expatrimoniais"[1].
3.     Flávio Tartuce considera dano social como sinônimo de dano difuso, “categoria que está bem próxima dos danos morais coletivos”[2],
4.    Reconhece-se que o dano social vincula-se a um "caráter pedagógico ou disciplinador da responsabilidade civil, com uma função de desestímulo para a repetição de conduta"[3].
5.     Para Antonio Junqueira de Azevedo, "os danos sociais (...) são lesões à sociedade, no seu nível de vida, tanto por rebaixamento de seu patrimônio moral – principalmente a respeito da segurança – quanto por diminuição na qualidade de vida"[4]. O dano social pode, pois, gerar repercussões materiais ou morais.
6.      Exemplifica e anota Flávio Tartuce:
"Os exemplos podem ser pitorescos: o pedestre que joga papel no chão, o passageiro que atende ao celular no avião, a loja do aeroporto que exagera nos preços em dias de apagão aéreo, a pessoa que fuma próximo ao posto de combustíveis, a empresa que diminui a fórmula no medicamento, o pai que solta o balão com o seu filho. Mas os danos podem ser consideráveis: a metrópole que fica inundada em dias de chuva; o avião que tem problema de comunicação, o que causa um acidente aéreo de grandes proporções; os passageiros atormentados que não têm o que comer (eis que a empresa aérea não paga o lanche); o posto de combustíveis explode; os pacientes que vêm a falecer; a casa atingida pelo balão que pega fogo. Diante dessas situações danosas que podem surgir, Junqueira de Azevedo sugere que o dano social merece punição e acréscimo dissusório, ou didático.
Note-se que os danos sociais são difusos, envolvendo direitos dessa natureza, em que as vítimas são indeterminadas ou indetermináveis. A sua reparação também consta expressamente do art. 6º, VI, do Código de Defesa do Consumidor."[5]
7.    Há controvérsia quanto ao destino do valores pagos a título de indenização. Uns sustentam que devem ir para uma instituição filantrópica, por aplicação analógica do art. 883, parágrafo único, do CC. Junqueira de Azevedo sustenta isso.
8.    No mesmo sentido, o TRT da 2ª Região "condenou o sindicato dos metroviários de São Paulo a destinar indenização para instituição filantrópica (cestas básicas) devido a uma greve totalmente abusiva que parou a grande metrópole (...) (TRT da 2ª Região, Dissídio coletivo de greve, Acórdão 2007001568, Relator(a): Sonia Maria Prince Franzini, Revisor(a): Marcelo Freire Gonçalves, Processo 20288-2007-000-02-00-2. (...))"[6].
9.      O TJRS, em caso envolvendo fraude de um sistema de loterias (no jogo conhecido como “Toto Bola”, manipulava as chances de êxito do consumidor), determinou, de ofício, o pagamento de indenização por dano social a ser revertido em favor do Fundo de Proteção aos Consumidores (TJRS, Recurso Cível 710011281054, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Ricardo Torres Hermann, j. 12.07.2007). Eis o que se colhe da ementa do julgado:

(...) 1. Não há que se falar em perda de uma chance, diante da remota possibilidade de ganho em um sistema de loterias. Danos materiais consistentes apenas no valor das cartelas comprovadamente adquiridas, sem reais chances de êxito.
2. Ausência de danos morais puros, que se caracterizam pela presença da dor física ou sofrimento moral, situações de angústia, forte estresse, grave desconforto, exposição à situação de vexame, vulnerabilidade ou outra ofensa a direitos da personalidade.
3. Presença de fraude, porém, que não pode passar em branco. Além de possíveis respostas na esfera do direito penal e administrativo, o direito civil também pode contribuir para orientar os atores sociais no sentido de evitar determinadas condutas, mediante a punição econômica de quem age em desacordo com padrões mínimos exigidos pela ética das relações sociais e econômicas. Trata-se da função punitiva e dissuasória que a responsabilidade civil pode, excepcionalmente, assumir, ao lado de sua clássica função reparatória/compensatória. “O Direito deve ser mais esperto do que o torto”, frustrando as indevidas expectativas de lucro ilícito, à custa dos consumidores de boa fé.
4. Considerando, porém, que os danos verificados são mais sociais do que propriamente individuais, não é razoável que haja uma apropriação particular de tais valores, evitando-se a disfunção alhures denominada de overcompensantion. Nesse caso, cabível a destinação do numerário para o Fundo de Defesa de Direitos Difusos, criado pela Lei 7.347/85, e aplicável também aos danos coletivos de consumo, nos termos do art. 100, parágrafo único, do CDC. Tratando-se de dano social ocorrido no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, a condenação deverá reverter para o fundo gaúcho de defesa do consumidor. (...)
(TJRS – Recurso Cível 71001281054 – Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais – Rel. Des. Ricardo Torres Hermann – j. 12.07.2007).
10.      Outro caso:
Em Goiás, a Turma Recursal dos Juizados Especiais condenou um banco a pagar 15 mil reais de indenização por danos sociais e 2.500 reais por danos morais em razão de um cliente ter esperado muito tempo para ser atendido. O valor da indenização por danos morais foi destinado ao cliente e a reparação por danos sociais revertida em favor de uma instituição de caridade. A referida decisão, contudo, foi suspensa pelo STJ em virtude de a condenação por danos sociais ter sido em sede de recurso do banco, configurando reformatio in pejus (AgRg na Reclamação Nº 13.200 – GO).[7]

11.    Alguns julgados do STJ:


RECLAMAÇÃO. ACÓRDÃO PROFERIDO POR TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS. RESOLUÇÃO STJ N. 12/2009. QUALIDADE DE REPRESENTATIVA DE CONTROVÉRSIA, POR ANALOGIA. RITO DO ART. 543-C DO CPC. AÇÃO INDIVIDUAL DE INDENIZAÇÃO. DANOS SOCIAIS. AUSÊNCIA DE PEDIDO.
CONDENAÇÃO EX OFFICIO. JULGAMENTO EXTRA PETITA. CONDENAÇÃO EM FAVOR DE TERCEIRO ALHEIO À LIDE. LIMITES OBJETIVOS E SUBJETIVOS DA DEMANDA (CPC ARTS. 128 E 460). PRINCÍPIO DA CONGRUÊNCIA. NULIDADE.
PROCEDÊNCIA DA RECLAMAÇÃO.
1. Na presente reclamação a decisão impugnada condena, de ofício, em ação individual, a parte reclamante ao pagamento de danos sociais em favor de terceiro estranho à lide e, nesse aspecto, extrapola os limites objetivos e subjetivos da demanda, na medida em que confere provimento jurisdicional diverso daqueles delineados pela autora da ação na exordial, bem como atinge e beneficia terceiro alheio à relação jurídica processual levada a juízo, configurando hipótese de julgamento extra petita, com violação aos arts. 128 e 460 do CPC.
[Extrai-se isto do relatório do voto-condutor: Em sentença às fls. 36/38, o pedido foi julgado parcialmente procedente para condenar o banco reclamante ao pagamento de: I) indenização no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de danos morais à ora interessada; e II) R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de danos sociais em favor do Conselho da Comunidade de Minaçu/GO.”]
2. A eg. Segunda Seção, em questão de ordem, deliberou por atribuir à presente reclamação a qualidade de representativa de controvérsia, nos termos do art. 543-C do CPC, por analogia.
3. Para fins de aplicação do art. 543-C do CPC, adota-se a seguinte tese: "É nula, por configurar julgamento extra petita, a decisão que condena a parte ré, de ofício, em ação individual, ao pagamento de indenização a título de danos sociais em favor de terceiro estranho à lide".
4. No caso concreto, reclamação julgada procedente.
(Rcl 12.062/GO, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/11/2014, DJe 20/11/2014). Do voto do Relator, extrai-se este excerto:

     "[...]mesmo que a autora formulasse eventual pedido de condenação em danos sociais na ação em exame, o pleito não haveria
de ser julgado procedente, porquanto esbarraria na ausência de legitimidade para postulá-lo. Os danos sociais são admitidos somente
em demandas coletivas e, portanto, somente os legitimados para propositura de ações coletivas têm legitimidade para reclamar acerca de supostos danos sociais decorrentes de ato ilícito, motivo por que
não poderiam ser objeto de ação individual."

RECLAMAÇÃO. JUIZADOS ESPECIAIS. DIREITO DO CONSUMIDOR. AGÊNCIA BANCÁRIA. "FILA". TEMPO DE ESPERA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONDENAÇÃO POR DANOS SOCIAIS EM SEDE DE RECURSO INOMINADO.
JULGAMENTO ULTRA PETITA. RECLAMAÇÃO PROCEDENTE.
1. Os artigos 2º, 128 e 460 do Código de Processo Civil concretizam os princípios processuais consabidos da inércia e da demanda, pois impõem ao julgador - para que não prolate decisão inquinada de vício de nulidade - a adstrição do provimento jurisdicional aos pleitos exordiais formulados pelo autor, estabelecendo que a atividade jurisdicional está adstrita aos limites do pedido e da causa de pedir.
2. Na espécie, proferida a sentença pelo magistrado de piso, competia à Turma Recursal apreciar e julgar o recurso inominado nos limites da impugnação e das questões efetivamente suscitadas e discutidas no processo. Contudo, ao que se percebe, o acórdão reclamado valeu-se de argumentos jamais suscitados pelas partes, nem debatidos na instância de origem, para impor ao réu, de ofício, condenação por dano social.
3. Nos termos do Enunciado 456 da V Jornada de Direito Civil do CJF/STJ, os danos sociais, difusos, coletivos e individuais homogêneos devem ser reclamados pelos legitimados para propor ações coletivas.
4. Assim, ainda que o autor da ação tivesse apresentado pedido de fixação de dano social, há ausência de legitimidade da parte para pleitear, em nome próprio, direito da coletividade.
5. Reclamação procedente.
(Rcl 13.200/GO, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 14/11/2014)

DIREITO COLETIVO E DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PLANO DE SAÚDE. CLÁUSULA RESTRITIVA ABUSIVA. AÇÃO HÍBRIDA. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS, DIFUSOS E COLETIVOS. DANOS INDIVIDUAIS.
CONDENAÇÃO. APURAÇÃO EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. DANOS MORAIS COLETIVOS. CONDENAÇÃO. POSSIBILIDADE, EM TESE. NO CASO CONCRETO DANOS MORAIS COLETIVOS INEXISTENTES.
1. As tutelas pleiteadas em ações civis públicas não são necessariamente puras e estanques. Não é preciso que se peça, de cada vez, uma tutela referente a direito individual homogêneo, em outra ação uma de direitos coletivos em sentido estrito e, em outra, uma de direitos difusos, notadamente em se tratando de ação manejada pelo Ministério Público, que detém legitimidade ampla no processo coletivo. Isso porque embora determinado direito não possa pertencer, a um só tempo, a mais de uma categoria, isso não implica dizer que, no mesmo cenário fático ou jurídico conflituoso, violações simultâneas de direitos de mais de uma espécie não possam ocorrer.
2. No caso concreto, trata-se de ação civil pública de tutela híbrida. Percebe-se que: (a) há direitos individuais homogêneos referentes aos eventuais danos experimentados por aqueles contratantes que tiveram tratamento de saúde embaraçado por força da cláusula restritiva tida por ilegal; (b) há direitos coletivos resultantes da ilegalidade em abstrato da cláusula contratual em foco, a qual atinge igualmente e de forma indivisível o grupo de contratantes atuais do plano de saúde; (c) há direitos difusos, relacionados aos consumidores futuros do plano de saúde, coletividade essa formada por pessoas indeterminadas e indetermináveis.
3. A violação de direitos individuais homogêneos não pode, ela própria, desencadear um dano que também não seja de índole individual, porque essa separação faz parte do próprio conceito dos institutos. Porém, coisa diversa consiste em reconhecer situações jurídicas das quais decorrem, simultaneamente, violação de direitos individuais homogêneos, coletivos ou difusos. Havendo múltiplos fatos ou múltiplos danos, nada impede que se reconheça, ao lado do dano individual, também aquele de natureza coletiva.
4. Assim, por violação a direitos transindividuais, é cabível, em tese, a condenação por dano moral coletivo como categoria autônoma de dano, a qual não se relaciona necessariamente com aqueles tradicionais atributos da pessoa humana (dor, sofrimento ou abalo psíquico).
5. Porém, na hipótese em julgamento, não se vislumbram danos coletivos, difusos ou sociais. Da ilegalidade constatada nos contratos de consumo não decorreram consequências lesivas além daquelas experimentadas por quem, concretamente, teve o tratamento embaraçado ou por aquele que desembolsou os valores ilicitamente sonegados pelo plano. Tais prejuízos, todavia, dizem respeito a direitos individuais homogêneos, os quais só rendem ensejo a condenações reversíveis a fundos públicos na hipótese da fluid recovery, prevista no art. 100 do CDC. Acórdão mantido por fundamentos distintos.
6. Recurso especial não provido.
(REsp 1293606/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 02/09/2014, DJe 26/09/2014)



11.    Por fim, remeto-me a este texto para aprofundamento:


“Enquanto no dano social a vítima é a sociedade; o dano moral coletivo tem como vítimas titulares de direitos individuais homogêneos, coletivos ou difusos. Se na prática a diferença é tênue, do ponto de vista da categorização jurídica, há diferenças entre as construções.”

“Dano social: uma nova categoria de dano indenizável. Análise dos primeiros julgados sobre o tema








[1] TARTUCE, Flávio. Direito civil, v. 2: direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013. P. 438.
[2] TARTUCE, Flávio. Direito civil, v. 2: direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013. P. 437.
[3] TARTUCE, Flávio. Direito civil, v. 2: direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013. P. 442.
[4] JUNQUEIRA, Antonio Junqueira de apud TARTUCE, Flávio. Direito civi, v. 2: direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013. P. 437-438.
[5] TARTUCE, Flávio. Direito civil, v. 2: direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013. P. 440.
[6] TARTUCE, Flávio. Direito civil, v. 2: direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2013. P. 441-442.