STJ
manteve condenação da TIM a pagar R$ 400.000,00 de dano moral coletivo por
venda casada, ao condicionar a concessão de um preço extremamente vantajoso
pelo serviço de telefonia móvel à aquisição de um aparelho celular:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART.
535 DO CPC. OMISSÃO INEXISTENTE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO DO
CONSUMIDOR.
TELEFONIA. VENDA CASADA. SERVIÇO E APARELHO.
OCORRÊNCIA. DANO MORAL COLETIVO. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.
1. Trata-se de ação civil pública apresentada ao
fundamento de que a empresa de telefonia estaria efetuando venda casada,
consistente em impor a aquisição de aparelho telefônico aos consumidores que
demonstrassem interesse em adquirir o serviço de telefonia.
2. Inexiste violação ao art. 535, II do CPC,
especialmente porque o Tribunal a quo apreciou a demanda de forma clara e
precisa e as questões de fato e de direito invocadas foram expressamente
abordadas, estando bem delineados os motivos e fundamentos que a embasam,
notadamente no que concerne a alegação de falta de interesse de agir do
Ministério Público de Minas Gerais.
3. É cediço que a marcha processual é orquestrada
por uma cadeia concatenada de atos dirigidos a um fim. Na distribuição da
atividade probatória, o julgador de primeiro grau procedeu à instrução do feito
de forma a garantir a ambos litigantes igual paridade de armas. Contudo, apenas
o autor da Ação Civil Pública foi capaz de provar os fatos alegados na
exordial.
4. O art. 333 do Código de Processo Civil prevê uma
distribuição estática das regras inerentes à produção de prova. Cabe ao réu o
ônus da impugnação específica, não só da existência de fatos impeditivos,
modificativos ou extintivos do direito do autor, como também da impropriedade
dos elementos probatórios carreados aos autos pela ex adversa. Nesse ponto,
mantendo-se silente o ora recorrido, correto o entendimento de origem, no ponto
em que determinou a incidência do art. 334, II, do CPC e por consequência, ter
recebido os documentos de provas do autor como incontroversos.
5. O fato de ter as instâncias de origem
desconsiderado a prova testemunhal da recorrida - porquanto ouvida na qualidade
de informante - não está apto a configurar cerceamento de defesa, pois a
própria dicção do art. 405, § 4º, do CPC, permite ao magistrado atribuir a esse
testemunho o valor que possa merecer, podendo, até mesmo, não lhe atribuir
qualquer valor.
6. Não tendo o autor sido capaz de trazer aos autos
provas concretas de sua escorreita conduta comercial, deve suportar as
consequências desfavoráveis à sua inércia. Fica, pois, afastado possível
violação aos arts. 267, VI, 333, II e 334, II do CPC.
7. A possibilidade de indenização por dano moral
está prevista no art. 5º, inciso V, da Constituição Federal, não havendo
restrição da violação à esfera individual. A evolução da sociedade e da
legislação têm levado a doutrina e a jurisprudência a entender que, quando são
atingidos valores e interesses fundamentais de um grupo, não há como negar a
essa coletividade a defesa do seu patrimônio imaterial.
8. O dano moral coletivo é a lesão na esfera moral
de uma comunidade, isto é, a violação de direito transindividual de ordem
coletiva, valores de uma sociedade atingidos do ponto de vista jurídico, de
forma a envolver não apenas a dor psíquica, mas qualquer abalo negativo à moral
da coletividade, pois o dano é, na verdade, apenas a consequência da lesão à
esfera extrapatrimonial de uma pessoa.
9. Há vários julgados desta Corte Superior de Justiça
no sentido do cabimento da condenação por danos morais coletivos em sede de
ação civil pública. Precedentes: EDcl no AgRg no AgRg no REsp 1440847/RJ, Rel.
Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/10/2014, DJe
15/10/2014, REsp 1269494/MG, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA,
julgado em 24/09/2013, DJe 01/10/2013; REsp 1367923/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO
MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/08/2013, DJe 06/09/2013; REsp 1197654/MG,
Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/03/2011, DJe
08/03/2012.
10. Esta Corte já se manifestou no sentido de que
"não é qualquer atentado aos interesses dos consumidores que pode
acarretar dano moral difuso, que dê ensanchas à responsabilidade civil. Ou
seja, nem todo ato ilícito se revela como afronta aos valores de uma
comunidade. Nessa medida, é preciso que o fato transgressor seja de razoável
significância e desborde os limites da tolerabilidade. Ele deve ser grave o
suficiente para produzir verdadeiros sofrimentos, intranquilidade social e
alterações relevantes na ordem extrapatrimonial coletiva. (REsp 1.221.756/RJ,
Rel. Min. MASSAMI UYEDA, DJe 10.02.2012).
11. A prática de venda casada por parte de
operadora de telefonia é capaz de romper com os limites da tolerância. No momento
em que oferece ao consumidor produto com significativas vantagens - no caso, o
comércio de linha telefônica com valores mais interessantes do que a de seus
concorrentes - e de outro, impõe-lhe a obrigação de aquisição de um aparelho
telefônico por ela comercializado, realiza prática comercial apta a causar
sensação de repulsa coletiva a ato intolerável, tanto intolerável que encontra
proibição expressa em lei.
12. Afastar, da espécie, o dano moral difuso, é
fazer tabula rasa da proibição elencada no art. 39, I, do CDC e, por via
reflexa, legitimar práticas comerciais que afrontem os mais basilares direitos
do consumidor.
13. Recurso especial a que se nega provimento.
(REsp 1397870/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA
TURMA, julgado em 02/12/2014, DJe 10/12/2014)
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