Amigos e amigas!
Estamos escrevendo um manual de direito civil com relativa
ousadia, por estarmos a tratar de temas pouco abordados nos manuais e por não
hesitarmos a expor nossas opiniões pessoais. Espero que, no próximo ano, a obra
saia do forno.
Por ora, quero antecipar o seguinte tema que está
sendo tratado no esboço do livro: condomínio edilício em graus e outras
aplicações práticas.
Deixo abaixo um excerto do livro. É claro que ainda poderei
mudar algumas ideias, mas penso que o que escrevi já permite uma boa reflexão.
Abraços
Carlos E Elias
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1. Condomínio edilício em parcela de
imóvel
O
condomínio edilício necessariamente importa na vinculação da fração ideal das
unidades autônomas ao terreno como um todo. Não é possível, portanto, vincular
apenas a uma fração ideal do solo. Se o titular do imóvel tiver esse interesse,
o recomendável é ele desdobrar o imóvel em outros dois, criando duas outras
matrículas, um para cada um dos imóveis. Em um desses imóveis menores (que terá
uma nova matrícula), será viável construir um prédio e instituir um condomínio
edilício próprio.
Se
o imóvel for indivisível, o caminho poderá ser o do condomínio de graus
sucessivos, que será tratado mais a frente.
2. Condomínio de graus sucessivos
2.1.
Definição e requisitos
Apesar
de pouco usual e de gerar alguns inconvenientes de ordem funcional, não há
obstáculo algum a que, na matrícula de uma unidade autônoma de um condomínio
edilício, seja instituído um novo condomínio, que aqui designamos de condomínio
de segundo grau.
É
possível também que, em uma unidade autônoma desse condomínio de segundo grau,
seja instituído um novo condomínio edilício, que agora receberia o batismo de
condomínio edilício de terceiro grau.
Outros
graus sucessivos de condomínio edilício seriam juridicamente cabíveis.
Temos
que só há dois requisitos necessários: (1) a existência de autorização expressa
no ato de instituição, na convenção do condomínio originário ou em votação
unânime dos condôminos, porque o condomínio de segundo grau estará a mudar as
características da unidade autônoma; e (2) a unidade autônoma na qual será
instituído o condomínio de grau sucessivo precisa fisicamente comportar uma
construção, pois, por exemplo, um apartamento em um prédio é fisicamente inapto
a receber uma nova construção em si.
No
caso de condomínio de segundo grau, o titular da unidade autônoma na qual ele
foi instituído será o novo condomínio, que será representado pelo síndico.
O
incômodo nesse tipo de condomínio de graus sucessivos é o fato de que o
síndico, por não poder praticar atos de mera administração sem prévia autorização
da convenção ou de assembleia, poderá retardar a dinâmica das assembleias do
condomínio originário.
2.2.
Casos especiais
2.2.1. Imóvel indivisível de larga extensão com condôminos interessados em
construir prédios nas áreas proporcionais às suas frações ideais
Já
tivemos notícia de casos concretos de condomínios de graus sucessivos em
serventias de registro de imóveis. Suponha que um terreno de extensão
considerável seja indivisível por força de lei. Esse matrícula possui uma
matrícula no competente Cartório de Registro de Imóveis (art. 176, § 1º, da Lei
nº 6.015/73 – Lei de Registros Públicos – LRP). Imagine que João seja titular
de uma fração ideal de 30% desse imóvel e Artur seja dono do restante.
Nessa
situação hipotética, João pode ter interesse em construir um prédio com
apartamentos em uma área correspondente a 30% do solo do terreno, deixando o
restante do solo para o Artur. Para formalizar isso, João e Artur poderão
instituir um condomínio edilício, estabelecendo que 70% do solo do terreno
corresponderá a uma unidade autônoma que coexistirá com as várias unidades
autônomas que corresponderão aos apartamentos. Artur pode ficar como
proprietário dessa unidade autônoma heterogênea.
Nesse
caso, como essa unidade autônoma extravagante comporta uma construção em si,
nada impede que Artur edifique um prédio de andares e institua um condomínio
edilício de segundo grau, o que será feito por meio de um registro de
instituição de condomínio na própria matrícula da unidade autônoma
extravagante.
2.2.2. “Condomínio edilícios fechados” com várias torres
Figuras
comuns nas grandes cidades são os empreendimentos imobiliários envolvendo
vários torres (prédios de andares) erguidas em um mesmo terreno com a
construção de áreas de lazer nesse mesmo terreno (campo de futebol, piscina
etc.) e com o fechamento de todo esse terreno mediante muros e instalação de
portarias para controle de acesso de entrada e saída. Como se podem estruturar
juridicamente esses condomínios edilícios fechados com vários torres?
Enxergamos
os seguintes arranjos.
Em
primeiro lugar, é possível simplesmente instituir um único condomínio edilício,
fixando que cada proprietário de uma unidade privativa (um apartamento) será um
condômino. Se, nesse conjunto imobiliário houver 4 torres e cada uma contiver
50 apartamentos, teremos 200 condôminos. A desvantagem dessa estrutura é a de
que, havendo a necessidade de assembleia para resolver problemas pontuais de
apenas uma das torres, será difícil obter quorum para votação. Aliás, diante da
grande quantidade de condôminos, haverá dificuldade para a obtenção de quorum
de votações para as questões em geral, pois, nesses arranjos imobiliários, é
comum a comunidade de condôminos envolver centenas de pessoas.
Em
segundo lugar, é viável valer-se do condomínio de segundo grau. Inicialmente,
pode-se instalar um condomínio em que a unidade autônoma será a base
territorial do solo sobre a qual será erguida cada torre. No exemplo acima,
como serão erguidas 4 torres, haverá 4 unidades autônomas e, portanto, 4
condôminos. Em seguida, em cada uma dessas unidades autônomas, pode ser
instituído um condomínio edilício (condomínio de segundo grau) após a
construção da respectiva torre. Nesse caso, cada torre corresponderá a um
condomínio edilício próprio e, portanto, os titulares dos apartamentos de cada
torre poderão resolver os seus problemas individuais relativos a cada torre de
modo isolado, por meio de assembleias próprias. Quanto ao primeiro condomíno
edilício – aquele que, no exemplo, possui 4 condôminos –, caberá a ele resolver
os problemas comuns a todas as torres, como as questões relativas a reparos das
piscinas, do campo de futebol, da portaria etc. As assembleias reunirão os 4
condôminos, que, agora, serão os 4 condomínios edilícios de segundo grau
criados, os quais serão representados pelos respectivos síndicos. Parece-nos
que essa estrutura de condomínio edilício é mais vantajosa juridicamente, por
facilitar as resolução de questões de interesse restrito de cada torre. Para a
formalização desses condomínios de segundo grau, é importante observar o quanto
já exposto mais acima no tocante aos seus requisitos, como a autorização
expressa na convenção ou em assembleia do primeiro condomínio.
Por
fim, não nos parece adequado que, nesses arranjos, seja utilizada a figura do
condomínio de lotes, exatamente porque ela tem de decorrer de um loteamento.
Nesses empreendimentos imobiliários para a instalação de várias torres, não há
a intenção de criar lotes, com toda a autonomia jurídica que lhe é inerente.
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