SEGURO
DE VEÍCULO E DE RESPONSABILIDADE CIVIL, EMBRIAGUEZ E TERCEIROS NO CASO DE
ACIDENTE DE TRÂNSITO
Carlos E. Elias de Oliveira
Brasília/DF, 12 de fevereiro de 2018.
1)
Havendo acidente de trânsito, a vítima pode
pleitear indenização contra o causador do dano e, também, nos limites do valor
da cobertura, contra a seguradora deste (se evidentemente este possuir seguro
de responsabilidade civil). Há necessidade de litisconsórcio para viabilizar a
defesa da própria seguradora. A seguradora responde solidariamente com o
segurado nesse caso (STJ, REsp 925.130/SP, 2ª Seção, Rel. Ministro Luis Felipe
Salomão, DJe 20/04/2012; REsp
962.230/RS, 2ª Seção, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, DJe 20/04/2012).
2)
Na relação entre segurado e seguradora, é
válida a cláusula que exclui o dever de pagar o seguro no caso de o segurado ou
de terceiro (a quem ele tiver cedido o veículo) estar embriagado no momento do
acidente, desde que a embriaguez tenha sido a causa. O problema é definir o
ônus da prova da embriaguez como causa do acidente. Segundo jurisprudência mais
recente e pacificada do STJ, para a seguradora, basta provar a embriaguez, o que,
por força das máximas da experiência, gerará uma presunção relativa de que ela
foi a causa do acidente. É, porém, garantido ao segurado refutar essa presunção
provando que, ainda que estivesse sóbrio, o acidente teria ocorrido de qualquer
maneira, como na hipótese de culpa exclusiva de outro motorista que jogou o
carro na contramão e causou o acidente (STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1602690/PE,
4ª Turma, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, DJe 04/12/2018).
3)
Em precedente bem polêmico, mudando
entendimento fixado anteriormente pela mesma Turma[1],
a 3ª Turma do STJ avançou para, em nome
da função social, entender que, embora seja lícita a cláusula de exclusão da
cobertura securitária por conta da embriaguez do motorista, essa cláusula é
ineficaz perante a vítima, que ainda assim pode pleitear a indenização contra a
seguradora em litisconsórcio com o segurado (STJ, REsp 1738247/SC, 3ª Turma, Rel.
Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 10/12/2018). O tema ainda será
amadurecido, pois não há precedente da 4ª Turma do STJ. Ao nosso sentir, a
cláusula deveria ser eficaz perante o terceiro, pois: (1) se a seguradora não
tem de pagar cobertura ao segurado – que é quem pagou o prêmio –, tampouco deve
fazê-lo a terceiro que sequer contratou o seguro; (2) o seguro de
responsabilidade civil aí não é obrigatório por lei; e (3) o julgado do STJ
acabará por repercutir no aumento do prêmio do seguro em prejuízo de todos os
consumidores.
PROCESSUAL
CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
ART.
543-C DO CPC. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS AJUIZADA DIRETA E EXCLUSIVAMENTE EM
FACE DA SEGURADORA DO SUPOSTO CAUSADOR.
DESCABIMENTO
COMO REGRA.
1.
Para fins do art. 543-C do CPC: 1.1. Descabe ação do terceiro prejudicado
ajuizada direta e exclusivamente em face da Seguradora do apontado causador do
dano.
1.2.
No seguro de responsabilidade civil facultativo a obrigação da Seguradora de
ressarcir danos sofridos por terceiros pressupõe a responsabilidade civil do
segurado, a qual, de regra, não poderá ser reconhecida em demanda na qual este
não interveio, sob pena de vulneração do devido processo legal e da ampla
defesa.
2.
Recurso especial não provido.
(REsp
962.230/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
08/02/2012, DJe 20/04/2012)
PROCESSUAL
CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
ART.
543-C DO CPC. SEGURADORA LITISDENUNCIADA EM AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MOVIDA
EM FACE DO SEGURADO. CONDENAÇÃO DIRETA E SOLIDÁRIA.
POSSIBILIDADE.
1.
Para fins do art. 543-C do CPC: Em ação de reparação de danos movida em face do
segurado, a Seguradora denunciada pode ser condenada direta e solidariamente
junto com este a pagar a indenização devida à vítima, nos limites contratados
na apólice.
2.
Recurso especial não provido.
(REsp
925.130/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
08/02/2012, DJe 20/04/2012)
CIVIL
E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SEGURO FACULTATIVO DE RESPONSABILIDADE
CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. LEGITIMIDADE DA SEGURADORA PARA FIGURAR NO
POLO PASSIVO EM LITISCONSÓRCIO COM O SEGURADO.
1.
Em ação de reparação de danos, a seguradora possui legitimidade para figurar no
polo passivo da demanda em litisconsórcio com o segurado, apontado causador do
dano.
2.
Recurso especial conhecido e provido.
(REsp
1076138/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
22/05/2012, DJe 05/06/2012)
AGRAVO
INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. CONTRATO DE SEGURO. CONDUTOR
DO VEÍCULO: FILHO DO SEGURADO. EMBRIAGUEZ DETERMINANTE. AGRAVAMENTO DO RISCO.
REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA N. 7
DO STJ. CONSONÂNCIA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. CONTRADIÇÃO
RECONHECIDA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROVIDOS.
1.
É firme a jurisprudência de ambas as turmas da Segunda Seção de que a
embriaguez, em sendo causa determinante do sinistro, agrava intencionalmente o
risco contratado, não se restringindo aos casos em que o próprio segurado se
encontra alcoolizado, devendo abranger, também, os condutores principais
(familiares, empregados e prepostos) que estejam na direção do veículo, haja
vista a violação do dever de vigilância e de escolha adequada a quem confia a
prática do ato, seja por o dolo ou culpa grave do segurado.
2.
É ônus da seguradora a prova da alcoolemia do condutor do veículo, que, uma vez
demonstrada, ensejará a presunção relativa de que o risco da sinistralidade foi
agravado (CC, art. 7568). Tal suposição será afastada, tornando devida a
indenização securitária, caso o segurado demonstre que o infortúnio ocorreria
independentemente do estado de embriaguez (v.g., culpa do outro motorista,
falha do próprio automóvel, imperfeições na pista, animal na estrada).
3.
Na hipótese, entender de forma diversa do acórdão recorrido para concluir que o
filho do segurado não estava embriagado no momento do acidente, que essa
condição não teria sido determinante para o agravamento do risco e de que o
infortúnio iria ocorrer independentemente do referido estado de alcoolemia,
demandaria o revolvimento fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na
súm 7 do STJ.
4.
A subsistência de fundamento inatacado apto a manter a conclusão do aresto
impugnado impõe o não conhecimento da pretensão recursal, a teor do
entendimento disposto na Súmula nº 283/STF.
5.
Agravo interno não provido.
(AgInt
nos EDcl no REsp 1602690/PE, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA,
julgado em 27/11/2018, DJe 04/12/2018)
RECURSO
ESPECIAL. CIVIL. SEGURO DE AUTOMÓVEL. GARANTIA DE RESPONSABILIDADE CIVIL.
ACIDENTE DE TRÂNSITO. CAUSA DO SINISTRO.
EMBRIAGUEZ
DE PREPOSTO DO SEGURADO. DEVER DE INDENIZAR DA SEGURADORA. CLÁUSULA DE
EXCLUSÃO. INEFICÁCIA PARA TERCEIROS.
PROTEÇÃO
À VÍTIMA. NECESSIDADE. TIPO SECURITÁRIO. FINALIDADE E FUNÇÃO SOCIAL.
1.
Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de
Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2.
A questão controvertida na presente via recursal consiste em definir se é
lícita a exclusão da cobertura de responsabilidade civil no seguro de automóvel
quando o motorista, causador do dano a terceiro, dirigiu em estado de
embriaguez.
3.
É lícita, no contrato de seguro de automóvel, a cláusula que prevê a exclusão
de cobertura securitária para o acidente de trânsito (sinistro) advindo da
embriaguez do segurado ou de preposto que, alcoolizado, assumiu a direção do
veículo. Configuração do agravamento essencial do risco contratado, a afastar a
indenização securitária. Precedentes.
4.
Deve ser dotada de ineficácia para terceiros (garantia de responsabilidade
civil) a cláusula de exclusão da cobertura securitária na hipótese de o
acidente de trânsito advir da embriaguez do segurado ou de a quem este confiou
a direção do veículo, visto que solução contrária puniria não quem concorreu
para a ocorrência do dano, mas as vítimas do sinistro, as quais não contribuíram
para o agravamento do risco.
5.
A garantia de responsabilidade civil não visa apenas proteger o interesse
econômico do segurado relacionado com seu patrimônio, mas, em igual medida,
também preservar o interesse dos terceiros prejudicados à indenização.
6.
O seguro de responsabilidade civil se transmudou após a edição do Código Civil
de 2002, de forma que deixou de ostentar apenas uma obrigação de reembolso de
indenizações do segurado para abrigar também uma obrigação de garantia da
vítima, prestigiando, assim, a sua função social.
7.
É inidônea a exclusão da cobertura de responsabilidade civil no seguro de
automóvel quando o motorista dirige em estado de embriaguez, visto que somente
prejudicaria a vítima já penalizada, o que esvaziaria a finalidade e a função
social dessa garantia, de proteção dos interesses dos terceiros prejudicados à
indenização, ao lado da proteção patrimonial do segurado.
8.
Recurso especial não provido.
(REsp
1738247/SC, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em
27/11/2018, DJe 10/12/2018)
[1]
STJ, REsp 1441620/ES, 3ª Turma, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Rel.
p/ Acórdão Ministra Nancy Andrighi, DJe 23/10/2017.
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