terça-feira, 18 de março de 2014

É inviável cancelar registro de reconhecimento de paternidade feito sob dúvidas (STJ)


INVIABILIDADE DE CANCELAR RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE FEITO SOB DÚVIDAS

 

               Mesmo sem vínculo socioafetivo, reconhecimento de filiação feito sob dúvida não pode ser cancelado posteriormente. O registro só poderia ser cancelado se tivesse sido provado erro ou falsidade do registro (art. 1.604, CC). Mera dúvida à época do registro não constitui erro.

 

 

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. SUCESSÃO PROCESSUAL DOS PAIS DO AUTOR. ADMISSIBILIDADE. RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE VOLUNTÁRIO. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. INESCUSÁVEL. SÚMULA 301/STJ. PRESUNÇÃO RELATIVA. RECUSA APRECIADA EM CONJUNTO COM DEMAIS ELEMENTOS PROBATÓRIOS. INTERPRETAÇÃO EM PREJUÍZO DO MENOR. IMPOSSIBILIDADE.

1. Ação negatória de paternidade distribuída em 21.09.2005, da qual foi extraído o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 10.04.2012.

2. Cinge-se a controvérsia a definir se é possível a declaração de nulidade do registro de nascimento, após reconhecimento de paternidade voluntário, sob a alegação de que há dúvidas acerca do vínculo biológico com o registrado e se  a  interpretação da Súmula 301/STJ permite que se presuma ausente a paternidade na hipótese em que o menor não comparece para a realização da perícia genética.

3. Admite-se a sucessão processual dos pais do autor de negatória de paternidade após a morte do requerente, a despeito da natureza personalíssima da ação.

4. O erro apto a caracterizar o vício de consentimento deve ser escusável, não podendo a ação negatória de paternidade fundar-se em mera dúvida, desconfiança que já havia ou deveria haver quando do reconhecimento voluntário, mormente em relacionamentos efêmeros, em que o envolvimento das partes restringe-se à conotação sexual.

5. A Súmula 301/STJ induz presunção relativa, de modo que a mera recusa à submissão ao exame não implica automaticamente reconhecimento da paternidade ou seu afastamento, pois deve ser apreciada em conjunto com os demais elementos probatórios.

6. A interpretação do enunciado sumular a contrario sensu, na hipótese dos autos, afronta o princípio do melhor interesse do menor e seu direito à identidade e desenvolvimento da personalidade.

7. Recurso especial provido.

(REsp 1272691/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/11/2013, DJe 08/11/2013)

 
 
DIREITO CIVIL. PROVA EM AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE.
Em ação negatória de paternidade, não é possível ao juiz declarar a nulidade do registro de nascimento com base, exclusivamente, na alegação de dúvida acerca do vínculo biológico do pai com o registrado, sem provas robustas da ocorrência de erro escusável quando do reconhecimento voluntário da paternidade. O art. 1.604 do CC dispõe que “ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro.” Desse modo, o registro de nascimento tem valor absoluto, independentemente de a filiação ter se verificado no âmbito do casamento ou fora dele, não se permitindo negar a paternidade, salvo se consistentes as provas do erro ou falsidade. Devido ao valor absoluto do registro, o erro apto a caracterizar o vício de consentimento deve ser escusável, não se admitindo, para esse fim, que o erro decorra de simples negligência de quem registrou. Assim, em processos relacionados ao direito de filiação, é necessário que o julgador aprecie as controvérsias com prudência para que o Poder Judiciário não venha a prejudicar a criança pelo mero capricho de um adulto que, livremente, a tenha reconhecido como filho em ato público e, posteriormente, por motivo vil, pretenda “livrar-se do peso da paternidade”. Portanto, o mero arrependimento não pode aniquilar o vínculo de filiação estabelecido, e a presunção de veracidade e autenticidade do registro de nascimento não pode ceder diante da falta de provas insofismáveis do vício de consentimento para a desconstituição do reconhecimento voluntário da paternidade. REsp 1.272.691-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 5/11/2013.

 

 

 

sexta-feira, 14 de março de 2014

O STJ e a Responsabilidade civil por assaltos ocorridos nos estacionamentos: instituições financeiras, grandes empresas e empresas de estacionamento.


           
O STJ e a Responsabilidade civil por assaltos ocorridos nos estacionamentos: instituições financeiras, grandes empresas e empresas de estacionamento.
 
 

   A instituição financeira responde por assaltos ocorridos no seu estacionamento (privativo de clientes) ou dentro da agência. Confira-se este julgado:
 
 
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ROUBO A CONSUMIDOR EM ESTACIONAMENTO COMERCIAL VINCULADO A BANCO. CASO FORTUITO. INEXISTÊNCIA. ENTENDIMENTO ADOTADO NESTA CORTE. VERBETE 83 DA SÚMULA DO STJ. NÃO PROVIMENTO.
1. Se as questões trazidas à discussão foram dirimidas, pelo Tribunal de origem, de forma suficientemente ampla, fundamentada e sem omissões deve ser afastada a alegada violação aos arts. 165, 458, 515 e 535 do Código de Processo Civil.
2. "A exploração comercial de estacionamento, que tem por escopo oferecer espaço e segurança aos usuários, afasta a alegação de força maior em caso de roubo havido dentro de suas instalações".
3. O Tribunal de origem julgou nos moldes da jurisprudência assente desta Corte. Incidente, portanto, o enunciado 83 da Súmula do STJ.
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no AREsp 376.268/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 18/02/2014, DJe 06/03/2014)
 
 Igualmente o supermercado (como o Extra) responde por assaltos ocorridos no seu estacionamento aos clientes. A propósito, cito este julgado:
 

Responsabilidade civil. Ação de conhecimento sob o rito ordinário.
Assalto à mão armada iniciado  dentro de estacionamento coberto de hipermercado.  Tentativa de estupro. Morte da vítima ocorrida fora do estabelecimento, em ato contínuo. Relação de consumo. Fato do serviço. Força maior. Hipermercado e shopping center. Prestação de segurança aos bens e à integridade física do consumidor. Atividade inerente ao negócio. Excludente afastada. Danos materiais.
Julgamento além do pedido. Danos morais. Valor razoável. Fixação em salários-mínimos. Inadmissibilidade. Morte da genitora. Filhos.
Termo final da pensão por danos materiais. Vinte e quatro anos.
 - A prestação de segurança aos bens e à integridade física do consumidor é inerente à atividade comercial desenvolvida pelo hipermercado e pelo shopping center, porquanto a principal diferença existente entre estes estabelecimentos e os centros comerciais tradicionais reside justamente na criação de um ambiente seguro para a realização de compras e afins, capaz de induzir e conduzir o consumidor a tais praças privilegiadas, de forma a incrementar o volume de vendas.
- Por ser a prestação de segurança e o risco ínsitos à atividade dos hipermercados e shoppings centers, a responsabilidade civil desses por danos causados aos bens ou à integridade física do consumidor não admite a excludente de força maior derivada de assalto à mão arma ou qualquer outro meio irresistível de violência.
- A condenação em danos materiais e morais deve estar adstrita aos limites do pedido, sendo vedada a fixação dos valores em salários-mínimos.
- O termo final da pensão devida aos filhos por danos materiais advindos de morte do genitor deve ser a data em que aqueles venham a completar 24 anos.
- Primeiro e segundo recursos especiais parcialmente providos e terceiro recurso especial não conhecido.
(REsp 419.059/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/10/2004, DJ 29/11/2004, p. 315)
 
Isso vale tb para assalto em estacionamento de Shopping Center:
 
 
RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TENTATIVA DE ROUBO EM CANCELA DE ESTACIONAMENTO DE SHOPPING CENTER. OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR.
1. A empresa que fornece estacionamento aos veículos de seus clientes responde objetivamente pelos furtos, roubos e latrocínios ocorridos no seu interior, uma vez que, em troca dos benefícios financeiros indiretos decorrentes desse acréscimo de conforto aos consumidores, o estabelecimento assume o dever - implícito em qualquer relação contratual - de lealdade e segurança, como aplicação concreta do princípio da confiança. Inteligência da Súmula 130 do STJ.
2. Sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor, não se vislumbra a possibilidade de se emprestar à referida Súmula uma interpretação restritiva, fechando-se os olhos à situação dos autos, em que configurada efetivamente a falha do serviço - quer pela ausência de provas quanto à segurança do estacionamento, quer pela ocorrência do evento na cancela do estacionamento, que se situa ainda dentro das instalações do shopping.
3. É que, no caso em julgamento, o Tribunal a quo asseverou a completa falta de provas tendentes a demonstrar a permanência na cena do segurança do shopping; a inviabilidade de se levar em conta prova formada unilateralmente pela ré - que, somente após intimada, apresentou os vídeos do evento, os quais ainda foram inúteis em virtude de defeito; bem como enfatizou ser o local em que se encontra a cancela para saída do estacionamento uma área de alto risco de roubos e furtos, cuja segurança sempre se mostrou insuficiente.
4. Outrossim, o leitor ótico situado na saída do estacionamento encontra-se ainda dentro da área do shopping center, sendo certo que tais cancelas - com controles eletrônicos que comprovam a entrada do veículo, o seu tempo de permanência e o pagamento do preço - são ali instaladas no exclusivo interesse da administradora do estacionamento com o escopo precípuo de evitar o inadimplemento pelo usuário do serviço.
5. É relevante notar que esse controle eletrônico exige que o consumidor pare o carro, insira o tíquete no leitor ótico e aguarde a subida da cancela, para que, só então, saia efetivamente da área de proteção, o que, por óbvio, o torna mais vulnerável à atuação de criminosos, exatamente o que ocorreu no caso em julgamento.
6. Recurso especial a que se nega provimento.
(REsp 1269691/PB, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 21/11/2013, DJe 05/03/2014)
 
 
  Todavia, há julgado do STJ excluindo a responsabilidade de lanchonete por roubos ocorridos no seu estacionamento, o que parece ser uma aparente contradição com assaltos ocorridos em estacionamento de Shopping e de supermercados. Na verdade, parece-nos que o critério está na legítima expectativa que o consumidor tem. No caso de uma empresa pequena, não dá para ele esperar uma segurança tão robusta quanto a de uma empresa grande. Veja-se este julgado:
 
 
RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TENTATIVA DE ROUBO EM CANCELA DE ESTACIONAMENTO DE SHOPPING CENTER. OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR.
1. A empresa que fornece estacionamento aos veículos de seus clientes responde objetivamente pelos furtos, roubos e latrocínios ocorridos no seu interior, uma vez que, em troca dos benefícios financeiros indiretos decorrentes desse acréscimo de conforto aos consumidores, o estabelecimento assume o dever - implícito em qualquer relação contratual - de lealdade e segurança, como aplicação concreta do princípio da confiança. Inteligência da Súmula 130 do STJ.
2. Sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor, não se vislumbra a possibilidade de se emprestar à referida Súmula uma interpretação restritiva, fechando-se os olhos à situação dos autos, em que configurada efetivamente a falha do serviço - quer pela ausência de provas quanto à segurança do estacionamento, quer pela ocorrência do evento na cancela do estacionamento, que se situa ainda dentro das instalações do shopping.
3. É que, no caso em julgamento, o Tribunal a quo asseverou a completa falta de provas tendentes a demonstrar a permanência na cena do segurança do shopping; a inviabilidade de se levar em conta prova formada unilateralmente pela ré - que, somente após intimada, apresentou os vídeos do evento, os quais ainda foram inúteis em virtude de defeito; bem como enfatizou ser o local em que se encontra a cancela para saída do estacionamento uma área de alto risco de roubos e furtos, cuja segurança sempre se mostrou insuficiente.
4. Outrossim, o leitor ótico situado na saída do estacionamento encontra-se ainda dentro da área do shopping center, sendo certo que tais cancelas - com controles eletrônicos que comprovam a entrada do veículo, o seu tempo de permanência e o pagamento do preço - são ali instaladas no exclusivo interesse da administradora do estacionamento com o escopo precípuo de evitar o inadimplemento pelo usuário do serviço.
5. É relevante notar que esse controle eletrônico exige que o consumidor pare o carro, insira o tíquete no leitor ótico e aguarde a subida da cancela, para que, só então, saia efetivamente da área de proteção, o que, por óbvio, o torna mais vulnerável à atuação de criminosos, exatamente o que ocorreu no caso em julgamento.
6. Recurso especial a que se nega provimento.
(REsp 1269691/PB, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 21/11/2013, DJe 05/03/2014)
 
   Por fim, o STJ não admite a responsabilização civil de empresas de estacionamento por assaltos ocorridos ao cliente, mas apenas por assaltos ocorridos do próprio veículo. Confiram-se estes julgados:
 
 
DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. ESTACIONAMENTO DE VEÍCULOS. ROUBO ARMADO DE CLIENTE QUE ACABARA DE EFETUAR SAQUE EM AGÊNCIA BANCÁRIA.
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTACIONAMENTO. ALCANCE. LIMITES.
1. Em se tratando de estacionamento de veículos oferecido por instituição financeira, o roubo sofrido pelo cliente, com subtração do valor que acabara de ser sacado e de outros pertences não caracteriza caso fortuito apto a afastar o dever de indenizar, tendo em vista a previsibilidade de ocorrência desse tipo de evento no âmbito da atividade bancária, cuidando-se, pois, de risco inerente ao seu negócio. Precedentes.
2. Diferente, porém, é o caso do estacionamento de veículo particular e autônomo - absolutamente independente e desvinculado do banco - a quem não se pode imputar a responsabilidade pela segurança individual do cliente, tampouco pela proteção de numerário anteriormente sacado na agência e dos pertences que carregava consigo, elementos não compreendidos no contrato firmado entre as partes, que abrange exclusivamente o depósito do automóvel. Não se trata, aqui, de resguardar os interesses da parte hipossuficiente da relação de consumo, mas de assegurar ao consumidor apenas aquilo que ele legitimamente poderia esperar do serviço contratado, no caso a guarda do veículo.
3. O roubo à mão armada exclui a responsabilidade de quem explora o serviço de estacionamento de veículos. Precedentes.
4. Recurso especial a que se nega provimento.
(REsp 1232795/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/04/2013, DJe 10/04/2013)