quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Acidente de trânsito e seguro: direito de indenização pela franquia, pelo bônus do seguro e outras questões

            
                                  Seguro de veículos e a sub-rogação

Seguem alguns apontamentos meus sobre a costumeira questão em epígrafe.

a.     No caso de abalroamento de veículos, se o segurado pagar franquia, a seguradora sub-roga-se no seu direito de pedir indenização contra o causador do dano apenas no valor excedente à franquia até o valor total do conserto do veículo (STJ, AgRg no AREsp 241.140 – ver julgados abaixo). O segurado, a seu turno, poderá pleitear o reembolso do valor pago a título de franquia do causador do dano. Dessa forma, o causador do dano, após reembolsar o segurado pela franquia e a seguradora pelo valor excedente, terá de pagar apenas o valor total do conserto do veículo.
b.    Por essa razão, se o causador do dano fizer acordo extrajudicial com o segurado para pagar-lhe o valor da franquia, isso não lhe demitirá do dever de indenizar a seguradora pelo valor excedente, até completar o valor total do conserto do veículo (STJ, AgRg no REsp 1175643 – ver julgados abaixo).
c.     Na praxe, o segurado costuma sofrer outros prejuízos em razão de ter-se valido do seguro, como a perda do famoso “bônus do seguro” (um desconto dado pela não utilização do seguro), e em razão da reparação do veículo, como a desvalorização do veículo. Embora esses danos materiais sejam indenizáveis, a sua comprovação sói ser inviável, de modo que, sem prova do prejuízo, inexiste indenização. Não se pode presumir esses danos materiais, pois a experiência demonstra que, apesar do conserto, há inúmeras situações em que o proprietário do bem consegue vendê-lo pelo mesmo valor de um veículo que nunca sofreu acidente (TJSP e TJRS – ver abaixo).
d.    Há contratos de seguro que dispensam a franquia no primeiro uso do seguro. Nesses casos, o segurado, ao acionar o seguro, perde esse benefício por culpa do causador do abalroamento. Entendemos que não há dano indenizável aí, por falta de viabilidade de estimar economicamente o prejuízo, por se tratar de benefício contratual sem conexão direta com o acidente (só há dano indenizável quando há nexo causal direto e imediato) e por ser injusto exigir que o causador do dano, além de pagar o valor integral do conserto do veículo perante a seguradora (que se sub-rogará nesse direito), tenha de desembolsar qualquer valor adicional. Ademais, se o segurado vier a acionar o seguro novamente, ele poderá cobrar regressivamente o valor despendido com a franquia do causador do novo abalroamento, o que reforça a inviabilidade de estimar economicamente o direito.
e.     Semelhantemente, o segurado não pode pleitear do causador do dano o reembolso do valor do prêmio total que pagou pelo contrato de seguro, pois essa despesa não tem nexo causal direto com o acidente; foi fruto de um serviço amplo sem conexão causal direta com o abalroamento.
                                               i.     Julgados:


Acidente de veículo - Indenização - Abalroamento na parte traseira do veículo do autor - Culpa do motorista que não evitou a colisão - Reconhecimento. Do registro constante do boletim de ocorrência não resulta presunção de veracidade dos fatos nele consignados. Referido registro constitui, entretanto, elemento de convicção que pode ser considerado pelo julgador. O evento ocorreu por culpa do motorista-réu que não evitou a colisão contra a traseira do veiculo do autor. Acidente de veículo - Perda do bônus e desvalorização do veículo - Alegações não provadas - Cancelamento. Relativamente à perda do bônus e à desvalorização do veículo, contudo, a reparação respectiva haveria de se encontrar fundamentada em prova segura o que de resto não se cuidou de providenciar, pelo que a indenização correspondente fica cancelada Recurso adesivo improvido e recursos do réu e da denunciada providos em parte. .
(TJ-SP - CR: 1073992007 SP, Relator: Orlando Pistoresi, Data de Julgamento: 17/09/2008,  30ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/09/2008)

APELAÇÕES CÍVEIS. RECURSO ADESIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL EM ACIDENTE DE TRÂNSITO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS PATRIMONIAIS POR ACIDENTE DE VEÍCULO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO CODEMANDADO MARCOS ROGÉRIO DANIEL. DESDOBRAMENTOS DA CONDENAÇÃO: PERDA DO BÔNUS DO SEGURO E DESVALORIZAÇÃO DO VEÍCULO. LUCROS CESSANTES. CONSECTÁRIOS LEGAIS. RECURSO ADESIVO.
(...)
2. DESDOBRAMENTOS DA CONDENAÇÃO: PERDA DO BÔNUS DO SEGURO E DESVALORIZAÇÃO DO VEÍCULO. LUCROS CESSANTES. A perda do bônus do seguro e a desvalorização do veículo não se trata de "fatos públicos e notórios", como pretende a recorrente, exigindo-se a prova prejuízo econômico, não produzida pela autora, a qual se limitou a alegar e não provar. Os danos materiais (onde se inserem as rubricas postuladas) demandam por prova inconteste da sua verificação, não havendo presunção de perda econômica.
(...)
 (TJ-RS - AC: 70063779284 RS, Relator: Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout, Data de Julgamento: 25/02/2016,  Décima Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 29/02/2016)

ACIDENTE DE TRÂNSITO. REPARAÇÃO DE DANOS REFERENTES À PERDA DE BÔNUS PARA RENOVAÇÃO DE CONTRATO DE SEGURO, DESVALORIZAÇÃO DO VEÍCULO, E DESPESAS COM GEOMETRIA E BALANCEAMENTO. 1. A perda do desconto quando da renovação do seguro não veio comprovada. O documento da fl. 22 não evidencia a diferença de valores em razão de envolvimento em sinistro, mas tão-somente a concessão do bônus "classe 10". 2. Quanto à desvalorização do veículo, em que pese seja presumível hipoteticamente esta, não há comprovação de que a colisão teria ensejado a real desvalorização do automóvel, porquanto realizada a reposição de peças extraviadas por outras novas. Também inexiste comprovação da quantificação segura da eventual desvalorização, impossibilitando a condenação. 3. Despesas com geometria e balanceamento realizadas meses após o sinistro que não evidenciam liame causal, porquanto houve o conserto integral do veículo pela seguradora. 4. Má-fé que não se reconhece. O fato de o réu trazer narrativa diversa da exposta pela autora, por si só, não caracteriza má-fé. Sentença confirmada por seus próprios fundamentos. RECURSO IMPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71003674769, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Marta Borges Ortiz, Julgado em 30/04/2013)

(TJ-RS - Recurso Cível: 71003674769 RS, Relator: Marta Borges Ortiz, Data de Julgamento: 30/04/2013,  Primeira Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 03/05/2013)

f.       
g.    Precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ACORDO EXTRAJUDICIAL ENTRE O SEGURADO E O CAUSADOR DO DANO. CONCLUSÃO DO ACÓRDÃO DE QUE A QUITAÇÃO ABRANGERA APENAS A FRANQUIA. CONSEQUENTE SUB-ROGAÇÃO DA SEGURADORA QUANTO AO SALDO REMANESCENTE. RECURSO ESPECIAL. REEXAME DE PROVAS. DESCABIMENTO. SÚMULA STJ/7.
I.- A partir da análise das circunstâncias fáticas da causa, concluiu o Tribunal de origem que a quitação dada pelo segurado, referente aos danos causados em seu veículo,  abrangeu pouco mais que o valor da franquia, quantia muito inferior ao total dos serviços realizados, sendo possível, por esse motivo, a sub-rogação da companhia seguradora nos direitos indenizatórios remanescentes.
2.- Inviável o reexame da questão em âmbito de recurso especial, ante o óbice da Súmula 7 desta Corte. Precedentes.
3.- Agravo Regimental improvido.
(AgRg no AREsp 241.140/RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/03/2013, DJe 25/03/2013)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESSARCIMENTO POR DANOS MORAIS. ACORDO EXTRAJUDICIAL SEM QUITAÇÃO PLENA DAS OBRIGAÇÕES. INVERSÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DE PROVAS.
INCIDÊNCIA DA SÚMULAS NºS 5 E 7/STJ.
1. Tendo a Corte de origem concluído que a quitação dada pelo segurado, vítima do acidente que danificou seu veículo, abrangeu exclusivamente o valor da franquia, muito inferior ao total do reparo, é impossível a revisão da julgado, a teor dos óbices contidos nas Súmulas n°s 5 e 7/STJ, pelo que cabível a sub-rogação da companhia seguradora nos direitos indenizatórios pela diferença remanescente.
2. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 845.920/PB, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/12/2012, DJe 27/02/2013)

AGRAVO REGIMENTAL. CIVIL E PROCESSUAL. ACORDO EXTRAJUDICIAL CELEBRADO ENTRE A VÍTIMA SEGURADA E A CAUSADORA DO DANO. ACÓRDÃO RECORRIDO. QUITAÇÃO ABRANGENDO APENAS A FRANQUIA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULAS 5 E 7 DO STJ.
I. Inadmissível o recurso especial que exige o reexame do conjunto fático-probatório dos autos.
2. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
(AgRg no REsp 1175643/RJ, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/03/2012, DJe 15/03/2012)



     Não é possível, no âmbito do recurso especial, o reconhecimento de  que  ocorreu  quitação  geral  e  ampla referente à obrigação do causador de acidente de trânsito de pagar toda a dívida à seguradora que  se  sub-rogou  no  crédito  do  segurado,  na hipótese em que o tribunal a quo entendeu que transação extrajudicial efetuada entre o segurado  e  o  causador  do dano abarcou apenas o valor referente à franquia, de sorte que não houve quitação geral e plena da obrigação de  indenizar,  pois,  para alterar a premissa firmada pelo tribunal de  origem,  é necessário o reexame de matéria de fato e de prova, o que é vedado pela Súmula 7 do STJ.


Sub-rogação. Indenização pedida pela seguradora que quitou o seguro relativo ao veículo segurado. Exclusão da franquia.
1. A seguradora sub-roga-se nos direitos do titular da apólice de seguro, sendo parte legítima para a ação regressiva contra o causador do dano.
2. Recurso especial não conhecido.
(REsp 600.890/DF, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/05/2005, DJ 01/08/2005, p. 443)

ACIDENTE DE TRÂNSITO. REPARAÇÃO DE DANOS REFERENTES À PERDA DE BÔNUS PARA RENOVAÇÃO DE CONTRATO DE SEGURO, DESVALORIZAÇÃO DO VEÍCULO, E DESPESAS COM GEOMETRIA E BALANCEAMENTO. 1. A perda do desconto quando da renovação do seguro não veio comprovada. O documento da fl. 22 não evidencia a diferença de valores em razão de envolvimento em sinistro, mas tão-somente a concessão do bônus "classe 10". 2. Quanto à desvalorização do veículo, em que pese seja presumível hipoteticamente esta, não há comprovação de que a colisão teria ensejado a real desvalorização do automóvel, porquanto realizada a reposição de peças extraviadas por outras novas. Também inexiste comprovação da quantificação segura da eventual desvalorização, impossibilitando a condenação. 3. Despesas com geometria e balanceamento realizadas meses após o sinistro que não evidenciam liame causal, porquanto houve o conserto integral do veículo pela seguradora. 4. Má-fé que não se reconhece. O fato de o réu trazer narrativa diversa da exposta pela autora, por si só, não caracteriza má-fé. Sentença confirmada por seus próprios fundamentos. RECURSO IMPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71003674769, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Marta Borges Ortiz, Julgado em 30/04/2013)

(TJ-RS - Recurso Cível: 71003674769 RS, Relator: Marta Borges Ortiz, Data de Julgamento: 30/04/2013,  Primeira Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 03/05/2013)