quinta-feira, 28 de abril de 2016

Airbnb e cia: o Estado deve ou não intervir e impor limites?

    O mercado, com sua incrível capacidade de criar novos modelos de negócios, surpreende diariamente os juristas com questões novas.
    Um tema que está causando rebuliços no mundo inteiro são os efeitos da multiplicação das locações por temporada em sites como o do Airbnb.
    Reclama-se que a proliferação desses negócios está causando o aumento do valor dos alugueis (em razão da redução da oferta), prejudicando comércios locais (especialmente estabelecimentos que dependem de vizinhança fixa, e não transitória) e concorrendo com a rede hoteleira local.
   Contra-argumenta-se que os proprietários desses imóveis obtêm renda que lhes garante o custeio das suas despesas pessoais (inclusive com aluguéis) e que eles estão apenas exercendo os seus direitos de propriedade.
   Na Alemanha, o Estado já está começando a tentar colocar restrições a esse negócio (http://www.dw.com/pt/berlim-aperta-o-cerco-contra-apartamentos-para-turistas/a-19223172).
   Em São Francisco, o Estado também tentou intervir (http://outracidade.com.br/sao-francisco-libera-o-airbnb-mas-teme-efeito-no-mercado-imobiliario/).
    No Brasil, o assunto já vem despertando movimentações do Estado. No Congresso Nacional, tramita um projeto de lei que estende os tributos incidentes aos hotéis sobre as locações por temporada promovidas por particulares, tudo para evitar uma concorrência desigual entre os hotéis e os proprietários dos imóveis de temporada (http://www.revistahoteis.com.br/airbnb-desperta-polemica-no-setor-hoteleiro/).
     Trata-se de uma forma de intervenção do Estado na economia, impondo limites ao exercício do direito de propriedade.
     Isso é ou não legítimo?
     Não há respostas pré-definidas.
      O importante, parece-nos, é que se olhem as consequências das intervenções econômicas (a Análise Econômica do Direito pode ser útil) e a essencialidade dos direitos e interesses envolvidos (o Paradigma da Essencialidade seria útil) para, ao final, com base em mecanismos democráticos de escolha, decida-se a política pública a ser adotada, ciente dos custos a serem suportados (o experimentalismo democrático pode ser útil).
     Não há um certeza prévia, mas é preciso refletir, decidir, arriscar e assumir responsabilidades.

Carlos Eduardo Elias de Oliveira

segunda-feira, 4 de abril de 2016

Embargos de Terceiro e posse fundada em título não registrado: extensão da Súmula 84/STJ

 EMBARGOS DE TERCEIRO NO CASO DE POSSE FUNDADA EM TÍTULO NÃO REGISTRADO
 Carlos Eduardo Elias de Oliveira


Dispõe a Súmula n. 84/STJ que cabem embargos de terceiro por posse advinda de PCV (promessa de compra e venda) não registrada em RI (Registro de Imóveis). Ex.: promitentes compradores de unidades em incorporação, em casos de incorporadora ter oferecido as unidades em garantia à CEF. A Súmula trata apenas do cabimento da ação, e não do mérito. O embargante merecerá êxito no feito, se sua posse for anterior ao ajuizamento da execução (de onde proveio a penhora embargada) e se inexistir má-fé sua (ou seja, inexistirem provas de que o embargante sabia da fraude).
Essa súmula revogou a antiga Súmula 621/STF ("Não enseja embargos de terceiro à penhora a promessa de compra e venda não inscrita no registro de imóveis").
Acresça-se que a Súmula n. 84/STJ, embora mencione a PCV, aplica-se também a outros negócios destinados à transmissão da propriedade, como a compra e venda.
Ademais, a súmula nº 84/STJ só é aplicável contra credores do promitente vendedor, e não contra terceiros adquirentes do imóvel[1]. Esse  verbete sumular centra-se no fato de que adquirentes de imóveis só podem perder a posse do bem a credores dos alienantes, se estiver caracterizada a fraude à execução. Ora, a fraude à execução depende de dois requisitos: (a) a existência de uma ação promovida pelo credor anteriormente à alienação do bem pelo devedor e (b) a presença do consilium fraudis, ou seja, da prova de má-fé do terceiro adquirente. Essa má-fé é absolutamente presumida quando, antes do negócio translativo, constava da matrícula do imóvel o registro da penhora (ou a averbação do ajuizamento da execução, nos termos do atual art. 615-A do CPC).  É por essa razão que a procedência dos embargos de terceiros fundados na Súmula nº 84/STJ depende desses dois requisitos.
Sem estar caracterizada a fraude à execução, a posse do adquirente do imóvel deve prevalecer sobre o direito dos credores do alienante. É como explanou o Ministro Bueno de Souza em um dos precedentes que gestaram a Súmula nº 84/STJ, in verbis:

"O saudoso Ministro Rodrigues Alckmin, por sua vez, no erudito voto-vista proferido no RE 76.769-GB (...). manteve-se fiel ao entendimento constante de seus julgados de Juiz do Tribunal de Alçada de São Paulo.
Eis a síntese de seu pensamento sobre o assunto
(...)
A alegação a que se prendeu o acórdão, de não achar-se registrada, no Registro de Imóveis, a promessa de cessão, equivale, sem dúvida, a negar que os embargos de terceiro possam proteger direitos obrigacionais, ou proteger a posse que, com apoio neles, se legitime. Reclamou o acórdão, para proteção do direito do terceiro embargante, que esse direito seja "real", pois, se referente a imóvel, que haja transcrição, inscrição ou averbação.
Além de afastar-se da doutrina e da jurisprudência (que, como visto, não restringe embargos de terceiro à proteção da propriedade e de direitos reais), o julgado não teve em conta que o problema devia ser encarado sob o aspecto de fraude à execução. E, provada a constituição de direito, de natureza obrigacional, embora, a favor de terceiro embargante, sem fraude à execução, nada justificava fosse desconhecido tal direito pelo exequente.
(...)"
(excerto do voto do Ministro Bueno de Souza no REsp nº 188/PR).


Ora, como o fundamento da Súmula nº 84/STJ é a presença ou não de fraude à execução (que, como é cediço, exige a presença do consilium fraudis), não há como alargar sua incidência para conflitos de títulos contraditórios relativos ao mesmo imóvel. Assim, por exemplo, se uma pessoa vende o mesmo imóvel para duas pessoas distintas, prevalecerá o direito daquela que, em primeiro lugar, registrar o título. Não importa quem tenha a posse mais antiga do bem, salvo, obviamente, se já tiver transcorrido o prazo de usucapião.
Por trás da Súmula nº 84/STJ, há um inescondível apelo à realidade social brasileira, conforme destaca o Ministro Bueno de Souza no precedente supracitado:

10. Em época mais recente, a explosão populacional, cada vez mais acentuada em áreas urbanas, vem determinando a inevitável expansão das cidades maiores, com o incessante e irreversível aparecimento de loteamentos ou meros fracionamentos de antigas chácaras dos arredores, cujos proprietários, muitas vezes, pessoas rústicas, são impelidos a esse improvisado empreendimento, da mesma forma que os adventícios, por sua vez, tangidos a adquirir pequenos lotes residenciais em áreas desprovidas de serviços públicos, onde constroem suas modestas habitações, fundados em contratos desprovidos de registro, pois o próprio loteamento é quase sempre irregular. Sobrevindo execução fiscal contra o improvisado loteador, os lotes já já edificados são, obviamente, preferidos pelos oficiais de justiça, para garantia do juízo.
A não se admitir, sequer, a oposição dos embargos de terceiro, fica a jurisdição impedida de tomar conhecimento das bases empíricas da demanda (ROSENBERG).
Daí o que se me afigura excessivo rigor do verbete 621, a que aludi, de início.
11. Penso, por conseguinte, que não se aconselha a peremptória recusa liminar da ação de embargos de terceiro, fundada em compromisso de compra e venda destituído, embora de registro imobiliário, como recomenda a Súmula 621 (...).
O que se recomenda, assim, é, data venia, que os embargos de terceiro, em casos tais, não sejam só por isso liminarmente recusados, mas devidamente processados, decididos como de direito, às instâncias locais incumbindo conhecer e apreciar as alegações e provas deduzidas em juízo.
Eis porque não posso emprestar minha adesão, ainda que desvaliosa, aos dizeres da jurisprudência sumulada, a qual, tudo indica, não se concilia com os imperativos da ordem social do nosso tempo.
A decisão recorrida admitiu e, afinal, acolheu os embargos de terceiro, que se insurgiram contra a penhora, fundando-se em contrato de compromisso de compra e venda desprovido de registro imobiliário, bem como na posse imediata do imóvel, afastada a ocorrência de fraude à execução.
Cumpre, pois, conhecer do recurso, por manifesta divergência do julgado com a Súmula 621 do Supremo Tribunal.
Nego-lhe, porém, provimento, pelas razões já expostas."
(excerto do voto do Ministro Bueno de Souza no REsp nº 188/PR).

No mesmo julgado, o Ministro Athos Carneiro enfatizou as repercussões sociais do caso[2] e concluiu que, entre dois direitos pessoais – o do credor e o do promitente comprador –, deve prevalecer este último, se não estiver configurada qualquer fraude contra credores nem fraude à execução.
Por fim, apesar de o promitente comprador triunfar nos embargos de terceiro fundados em promessa de compra e venda não registrada em razão de sua posse ser anterior ao ajuizamento da execução e de inexistir má-fé, foi ele quem deu causa à penhora embargada ao não ter dado publicidade ao seu título pela via cabível, o registro no cartório de imóveis. Por essa razão, o promitente comprador, embora vencedor nos embargos de terceiro, terá de arcar com as custas e os honorários advocatícios, nos termos da Súmula n. 303/STJ ("Em embargos de terceiro, quem deu causa à constrição indevida deve arcar com os honorários advocatícios").
Como se vê, a Súmula n. 84/STJ é uma flexibilização da importância dos registros públicos e enseja certa insegurança nos negócios jurídicos. Quem pretenda tornar-se credora de outra pessoa não pode limitar-se a consultar a matrícula dos imóveis; cumpre-lhe também ir ao bem para diligenciar para verificar se outrem está lá a exercer a posse com fundamento em algum título aquisitivo não registrado. A Súmula n. 84/STJ, portanto, cria uma insegurança e um cenário de desconfiança nas relações creditícias, ao opor empecilhos ao direito do "terceiro de boa-fé que contrata com o alienante e tem no patrimônio deste a garantia do cumprimento das obrigações por ele assumidas" (excerto do voto do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira no julgamento do REsp 247/SP, 4ª Turma, DJ 20/11/1989, que se opusera, com seu voto-vencido e com o apoio insuficiente do Ministro Barros Monteiro, ao entendimento atualmente consolidado firmado pelo STJ).
E mais. A Súmula n. 84/STJ representa mais uma exceção ao princípio da relatividade dos contratos, pois a promessa de compra e venda não registrada está a ultrapassar os limites da tradicional eficácia inter partes dos contratos para irradiar efeitos contra terceiros – que se digam credores do promitente vendedor –, como que a reivindicar uma eficácia erga omnes. Trata-se, portanto, de um exemplo de tutela externa do crédito, de doutrina do terceiro cúmplice, de transpersonalização.

EXECUÇÃO - PENHORA - CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA - EMBARGOS DE TERCEIROS - POSSIBILIDADE.
O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VEM ABRANDANDO O RIGOR DA SUMULA NUM. 621 DO STF, ADMITINDO QUE O TITULAR DE CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA, NÃO INSCRITO NO REGISTRO DE IMOVEIS, TEM DIREITO DE AJUIZAR EMBARGOS DE TERCEIRO.
RECURSO PROVIDO.
(REsp 90.192/MG, Rel. Ministro GARCIA VIEIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 31/03/1998, DJ 18/05/1998, p. 29). Nesse caso, o STJ deu provimento ao recurso especial para julgar procedentes os embargos de terceiro ajuizados por Gélio e sua mulher. Estes havia firmado contrato particular de promessa de compra e venda e, com isso, haviam se tornado legítimos possuidores do imóvel muito antes do ajuizamento de ação de execução contra o promitente vendedor, o sr. Orcino. A posse era mais antiga do que o ajuizamento da execução e, por isso, recebeu maior prestígio em sede de embargos de terceiro. A penhora, portanto, teve de ser cancelada.


PROCESSO CIVIL. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA NÃO REGISTRADO.
EXECUÇÃO. BEM PENHORADO. EMBARGOS DE TERCEIRO. POSSE NÃO COMPROVADA.
INDICIOS DE FRAUDE. PRECEDENTES. RECURSO DESACOLHIDO.
I  - Conquanto mitigado o rigor do enunciado n. 621, da sumula/STF pela jurisprudência sumulada deste Superior Tribunal de Justiça (verbete n. 84), inadmissível o acolhimento de embargos de terceiro ajuizados, com o intuito de desconstituir penhora sobre imóvel objeto de compromisso de compra e venda não registrado, se inexistente comprovação de que o embargante, antes da execução, detinha a posse do imóvel, e se, ademais, detectadas pelas instancias ordinárias circunstâncias evidenciadoras de fraude.
II - Para serem acolhidos os embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido de registro, necessárias se fazem não só a demonstração de que a celebração do compromisso, com quitação do preço, ocorreu antes de ajuizada a execução, mas também a comprovação da posse do embargante e a certeza quanto a inexistência de fraude.
(REsp 39.144/SP, Rel. MIN. SALVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 16/11/1993, DJ 07/02/1994, p. 1187). Nesse caso, havia indícios de fraude pelo promitente comprador do imóvel e inexistia prova de que este detinha posse do bem anteriormente ao ajuizamento da execução, razão por que os embargos de terceiros não foram acolhidos. A penhora sobre o bem em razão de execução movida contra o promitente-vendedor prevaleceu sobre o direito decorrente da promessa de compra e venda não registrada e que fora firmada com o embargante.

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO.
1. LAVRA NESTA CORTE PACIFICO E REITERADO ENTENDIMENTO QUE DIVERGE FRONTALMENTE COM OS DIZERES DA SUMULA 621 DO STF.
2. ACORDÃO RECORRIDO QUE, AO EXAME SOBERANO DE MATERIA FATICA, CONCLUIU PELA INEXISTENCIA DE FRAUDE A EXECUÇÃO.
3. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO, MAS IMPROVIDO.
(REsp 1.477/SP, Rel. Ministro BUENO DE SOUZA, QUARTA TURMA, julgado em 27/08/1991, DJ 07/10/1991). Nesse caso, o executado vendeu, por escritura pública, o imóvel em 1980. Os compradores edificaram uma casa nesse bem. O registro dessa venda só ocorreu em 22/9/1987, alguns dias depois de os compradores tomarem ciência da penhora por meio de citação recebida em 15/9/1987. O STJ entendeu procedentes os embargos de terceiro em razão da anterioridade da posse em relação à execução.



EMBARGOS DE TERCEIRO POSSUIDOR, OPOSTOS POR COMPRADOR ANTE PENHORA DO IMOVEL PROMETIDO COMPRAR.
O comprador, devidamente imitido na posse do imóvel, pode opor embargos de terceiro possuidor - cpc, art. 1046, paragrafo 1. - para  impedir penhora promovida por credor do vendedor.
A ação do comprador não é obstada pela circunstância de não se encontrar o contrato registrado no ofício imobiliário. Inocorrência de fraude.
O registro imobiliário somente é imprescindível para a oponibilidade face aqueles terceiros que pretendam sobre o imóvel direito juridicamente incompatível com a pretensão aquisitiva do comprador. Não é o caso do credor do vendedor.
Orientação de ambas as turmas da 2a. Seção do Superior Tribunal de Justiça.
Recurso especial conhecido pela letra c (sumula 621-stf), mas não provido.
(REsp 6.128/PR, Rel. Ministro ATHOS CARNEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 05/03/1991, DJ 01/04/1991). Nesse caso, a posse do promitente comprador se iniciou antes da constituição da dívida que deu origem à execução da qual partiu a penhora do bem. O STJ reconheceu a procedência dos embargos de terceiro.

EMBARGOS DE TERCEIRO. SUMULA N. 621 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
I   - É firme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, mitigada a súmula n. 621 do Supremo Tribunal Federal, no sentido da admissão de embargos de terceiro com o fito de livrar da constrição judicial imóvel não transcrito no registro imobiliário, porém comprovadamente na posse do embargante antes da execução.
II  - Agravo regimental denegado.
III - Unânime.
(AgRg no Ag 5.351/SP, Rel. Ministro FONTES DE ALENCAR, QUARTA TURMA, julgado em 06/11/1990, DJ 03/12/1990)


PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. ITCMD. IMÓVEL ADQUIRIDO ANTES DO CASAMENTO MAS LEVADO A REGISTRO NA CONSTÂNCIA DESTE. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. BEM PERTENCENTE AO CÔNJUGE SUPÉRSTITE E INCOMUNICÁVEL. EXAÇÃO INDEVIDA.
1. Inexiste violação do art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem resolve a controvérsia de maneira sólida e fundamentada, apenas não adotando a tese da recorrente.
2. A jurisprudência desta Corte "tem abrandado a cogência da regra jurídica que sobreleva a formalidade em detrimento do direito subjetivo perseguido. Para tal temperamento, contudo, é necessário que a forma imposta esteja sobrepujando a realização da Justiça. É o exemplo da Súmula 84 do STJ que admite a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido de registro" (REsp 707.092/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 1º.8.2005).
3. Bens imóveis adquiridos pelo cônjuge supérstite em data bem anterior ao casamento, ainda que levados a registro na constância deste, escapam à cobrança do imposto sobre transmissão causa mortis por não terem adentrado no patrimônio da esposa falecida.
4. Recurso especial não provido.
(REsp 1304116/PR, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/09/2012, DJe 04/10/2012)

REGISTROS PÚBLICOS E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL.
EMBARGOS DE TERCEIRO. ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA DESPROVIDA DE REGISTRO. INSTRUMENTO LAVRADO EM COMARCA DIVERSA DA SITUAÇÃO DO IMÓVEL. IRRELEVÂNCIA. ART. 8º DA LEI N. 8.935/94. NÃO COMPROVAÇÃO DE FRAUDE OU SIMULAÇÃO NA VENDA DO IMÓVEL PELO DEVEDOR AO EMBARGANTE.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 84/STJ.
1. Nos termos do que dispõe o art. 108 do Código Civil, é a escritura pública o instrumento hábil para documentar compra e venda de bem imóvel de valor superior ao de alçada legal, formalizando o negócio jurídico que, em si, não transfere a propriedade do imóvel, e que antecede ao ato efetivamente translativo da propriedade, isto é, o registro.
2. O artigo 8º da Lei n. 8.935/94 (Lei dos Cartórios) franqueia ampla liberdade para escolha do tabelionato visando à celebração da venda do imóvel, formalizada em escritura pública, pois este é ato eminentemente negocial e do qual exsurgem apenas efeitos pessoais. É somente o registro do título que deve ser realizado no respectivo cartório de registro de imóveis no qual o bem se encontra matriculado, nos termos dos arts. 167 e 169 da Lei n. 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos).
3. Com efeito, sendo irrelevante o fato de a escritura pública de compra e venda desprovida de registro não ter sido lavrada na comarca da situação do imóvel, somando-se ao fato de não ter havido reconhecimento de fraude, simulação ou falsificação, aplica-se a Súmula n. 84: "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro".
4. "Em embargos de terceiro, quem deu causa à constrição indevida deve arcar com os honorários advocatícios" (Súmula n. 303).
5. Recurso especial parcialmente conhecido e, na extensão, provido.
(REsp 960.849/AM, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 05/06/2012, DJe 02/08/2012)

EMBARGOS DE TERCEIRO. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA CELEBRADO ANTERIORMENTE AO AJUIZAMENTO DA EXECUÇÃO. SÚMULAS 84 E 375/STJ.
1.- "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro" (Súmula 84/STJ).
2.- A jurisprudência desta Corte, consolidada com a edição da Súmula 375/STJ, orienta que sem o registro da penhora sobre o imóvel ou prova da má-fé do adquirente, não há que se falar em fraude à execução.
3.- Agravo Regimental improvido.
(AgRg no AREsp 48.147/RN, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/02/2012, DJe 24/02/2012)

                                                                                     

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AGRAVO REGIMENTAL. FRAUDE À EXECUÇÃO. INOCORRÊNCIA. DOAÇÃO ANTERIOR AO AJUIZAMENTO DAS EXECUÇÕES. AUSÊNCIA DE REGISTRO NO CARTÓRIO DE IMÓVEIS. SÚMULA 84 DO STJ.
I.- Sendo incontroverso nos autos que a doação dos imóveis do casal às filhas menores se deu por meio de instrumentos particulares, submetidos ao Ofício de Notas para o reconhecimento, em data anterior ao ajuizamento das execuções, não há que se falar em fraude à execução.
II.- Segundo o entendimento pacífico desta Corte, a ausência de registro da escritura no cartório de imóveis não impede o acolhimento da pretensão das recorrentes - por aplicação da Súmula 84/STJ, por analogia -, preservando-se, assim, o bem, daquele estranho à lide, que seja objeto de constrição judicial indevida, ainda que exista relação de parentesco do proprietário ou possuidor com o executado. Precedentes.
Agravo Regimental improvido.
(AgRg no REsp 921.768/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/02/2011, DJe 28/02/2011)

COMERCIAL. FALÊNCIA. AÇÃO REVOCATÓRIA. EMBARGOS DE TERCEIROS ADQUIRENTES DE IMÓVEL ANTES DA DECLARAÇÃO DA QUEBRA. BOA-FÉ.
EFEITOS. SÚMULA N. 84-STJ.
I. Não se submetem aos efeitos da ação revocatória movida pela massa falida exclusivamente contra a empresa compradora de prédio arrecadado, os terceiros de boa-fé que adquiriram os apartamentos antes da declaração da quebra da vendedora originária.
II. "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro." - Súmula n. 84 do STJ.
III. Recurso especial não conhecido.
(REsp 533.656/RJ, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 06/04/2010, DJe 01/02/2011)

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA DE BEM ALIENADO A TERCEIRO DE BOA-FÉ. AUSÊNCIA DE TRANSCRIÇÃO DO TÍTULO NO REGISTRO DE IMÓVEIS. PRESUNÇÃO DE AUSÊNCIA DE FRAUDE.
1. A exigência do registro da penhora, muito embora não produza efeitos infirmadores da regra prior in tempore prior in jure, exsurgiu com o escopo de conferir à mesma efeitos erga omnes para o fim de caracterizar a fraude à execução na alienação de bem imóvel pendente execução fiscal.
2. À luz do art. 530 do Código Civil, sobressai claro que a lei reclama o registro dos títulos translativos da propriedade imóvel por ato inter vivos, onerosos ou gratuitos, posto que os negócios jurídicos em nosso ordenamento jurídico, não são hábeis a transferir o domínio do bem. Assim, titular do direito é aquele em cujo nome está transcrita a propriedade imobiliária.
3. A jurisprudência do STJ, sobrepujando a questão de fundo sobre a questão da forma, como técnica de realização da justiça, vem conferindo interpretação finalística à Lei de Registros Públicos.
Assim é que foi editada a Súmula 84, com a seguinte redação: "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro".
4. Consoante cediço no e. STJ: "O CTN nem o CPC, em face da execução, não estabelecem a indisponibilidade de bem alforriado de constrição judicial. A pré-existência de dívida inscrita ou de execução, por si, não constitui ônus 'erga omnes', efeito decorrente da publicidade do registro público. Para a demonstração do 'consilium fraudis' não basta o ajuizamento da ação. A demonstração de má-fé, pressupõe ato de efetiva citação ou de constrição judicial ou de atos repersecutórios vinculados a imóvel, para que as modificações na ordem patrimonial configurem a fraude. Validade da alienação a terceiro que adquiriu o bem sem conhecimento de constrição já que nenhum ônus foi dado à publicidade. Os precedentes desta Corte não consideram fraude de execução a alienação ocorrida antes da citação do executado alienante. (EREsp. 31.321/SP, Rel.
Min. MILTON LUIZ PEREIRA, DJU 16.11.99) 5. À fraude in re ipsa fica sujeito aquele que adquire do penhorado, salvo se houver o conhecimento erga omnes produzido pelo registro da penhora. A doutrina do tema assenta que: "Hodiernamente, a lei exige o registro da penhora, quando imóvel o bem transcrito. A novel exigência visa à proteção do terceiro de boa-fé, e não é ato essencial à formalização da constrição judicial; por isso o registro não cria prioridade na fase de pagamento. Entretanto, a moderna exigência do registro altera a tradicional concepção da fraude de execução; razão pela qual, somente a alienação posterior ao registro é que caracteriza a figura em exame. Trata-se de uma exceção criada pela própria lei, sem que se possa argumentar que a execução em si seja uma demanda capaz de reduzir o devedor à insolvência e, por isso, a hipótese estaria enquadrada no inciso II do art. 593 do CPC.
A referida exegese esbarraria na inequívoca ratio legis que exsurgiu com o nítido objetivo de proteger terceiros adquirentes. Assim, não se pode mais afirmar que quem compra do penhorado o faz em fraude de execução. 'É preciso verificar se a aquisição precedeu ou sucedeu o registro da penhora'. Neste passo, a reforma consagrou, no nosso sistema, aquilo que de há muito se preconiza nos nossos matizes europeus." (Curso de Direito Processual Civil, Luiz Fux, 2ª Ed., pp.
1298/1299).  Precedentes: REsp. 866.520/AL, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJU 21.10.08; REsp. 944250/RS, Rel. Min.  CASTRO MEIRA, DJU 07.08.07; AgRg no REsp. 924.327/RS, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJU 26.06.07; REsp. 638.664/PR, desta relatoria, DJU 02.05.05; REsp.
791.104/PR, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJU 06.02.2006; REsp.
665.451/CE, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJU 07.11.05, REsp. 468.718/SC, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJU 15.04.03; AgRg no Ag 448.332/RS, Rel.
Min. JOSÉ DELGADO, DJU  21.10.02; REsp. 171.259/SP, Rel. Min. MILTON LUIZ PEREIRA, DJU 11.03.02.
6. Deveras, in casu, a penhora efetivou-se em 19.12.00, e a alienação do imóvel pelos executados, após o redirecionamento da execução à adquirente, realizou-se em 04.01.01, devidamente registrada no Cartório de Imóveis da 3ª Circunscrição de Campo Grande em 13.02.01 (fls. 123/125), data em que não havia qualquer ônus sobre a matrícula do imóvel, cujo mandado de registro de penhora só foi expedido em 07.05.03 (fls. 113).
7. Recurso especial desprovido.
(REsp 858.999/MS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/03/2009, DJe 27/04/2009)


TRIBUTÁRIO - EMBARGOS DE TERCEIRO - EXECUÇÃO FISCAL - FRAUDE À EXECUÇÃO - IMÓVEL ALIENADO E NÃO TRANSCRITO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO - ART. 530, I, DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO - SÚMULA 84/STJ.
1. Jurisprudência da Corte segundo a qual se reconhece a validade de contrato de compra e venda, embora não efetuada a transcrição no registro imobiliário (Súmula 84/STJ), para efeito de preservação do direito da posse do terceiro adquirente de boa-fé.
2. No caso de alienação de bens imóveis, na forma da legislação processual civil (art. 659, § 4º, do CPC, desde a redação da Lei 8.953/94), apenas a inscrição de penhora ou arresto no competente cartório torna absoluta a assertiva de que a constrição é conhecida por terceiros e invalida a alegação de boa-fé do adquirente da propriedade.
3. Ausente o registro de penhora ou arresto efetuado sobre o imóvel, não se pode supor que as partes contratantes agiram em consilium fraudis. Para tanto, é necessária a demonstração, por parte do credor, de que o comprador tinha conhecimento da existência de execução fiscal contra o alienante ou agiu em conluio com o devedor-vendedor, sendo insuficiente o argumento de que a venda foi realizada após a citação do executado.
4. Assim, em relação ao terceiro, somente se presume fraudulenta a alienação de bem imóvel realizada posteriormente ao registro de penhora ou arresto.
5. Recurso especial improvido.
(REsp 892.117/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/11/2008, DJe 17/11/2009)

PROCESSO CIVIL - EMBARGOS DE TERCEIRO - PARTILHA DE BENS EM SEPARAÇÃO CONJUGAL SEM REGISTRO - ART. 530, I, CC/1916 - PREQUESTIONAMENTO:NÃO-OCORRÊNCIA.
1. O art. 530, I, do CC/1916 não foi prequestionado na origem por julgamento em que se considerou que a partilha efetivada antes do processo de execução não poderia ser objeto de penhora.
2. O STJ, pela Súmula 84, permite a defesa da posse por embargos de terceiro. A posse, como situação fática, independe de registro.
3. Recurso não conhecido.
(REsp 1030962/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/10/2008, DJe 07/11/2008)



[1] STJ, REsp 6.128/PR, Rel. Ministro ATHOS CARNEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 05/03/1991, DJ 01/04/1991
[2] A propósito, afirmou o Ministro:
Sabemos que, no nosso país, principalmente nas camadas pobres da população, um grande número de negócios, e até direi, a maior parte dos negócios, é efetuada de maneira menos formal, e até absolutamente informal. Compram-se e vendem-se pequenos terrenos e casas apenas mediante a emissão de recibos, sinais de arras e mesmo de promessa de compra-e-venda ou "transferências de posse" redigidos de forma a mais singela. E é muitíssimo comum que esses documentos não venham a ser registrados no Registro de Imóveis, inclusive porque os termos em que estão vazados não permitiriam o registro. Para o registro imobiliário é necessário que o contrato revista determinados requisitos, o que exige, frequentemente, a presença do tabelião ou do profissional do Direito.
Então, com frequência, ocorre na vida jurídica termos alguém que é possuidor do seu terreno ou da sua casa há muitos anos, em inteira boa-fé, que já pagou a totalidade do preço há muitos anos, e de repente é surpreendido por uma penhora, em execução promovida contra aquele que lhe havia "alienado" o imóvel; nos termos da aludida Súmula [a de n. 621/STF], irá perder seus direitos à posse e à aquisição da propriedade.
Então, vemos aqui os dois pratos da balança: de um lado, temos o direito do credor, direito pessoal; do outro lado, o direito, também pessoal, do possuidor e promitente comprador. Geralmente, como no caso dos autos, o possuidor já mantinha o seu direito de posse e os direitos de aquisição decorrentes de sua promessa de compra-e-venda desde antes do surgimento do crédito que origina a penhora.
Então se pergunta: entre as duas pretensões, a do credor, direito pessoal, e a do promitente comprador com justa posse, direito também pessoal, qual é aquela que merece maior proteção da ordem jurídica?
(...)
Creio mais conforme com as necessidades atuais do comércio jurídico a interpretação pela qual, no choque de interesses de dois direitos eminentemente pessoais (a própria penhora não é direito real, mas ato processual executivo), tanto um quanto outro, deve prevalecer o direito daquele que está na justa posse do imóvel, como seu legítimo pretendente à aquisição, e com o preço quitado, face ao direito do credor do promitente vendedor, dês que ausente, por certo, qualquer modalidade de fraude a credores ou à execução, como no caso." (excerto do voto do Ministro Athos Gusmão Carneiro no REsp nº 188/PR)