quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Impeachment sem perda dos direitos políticos: é possível juridicamente?

No dia 31 de agosto de 2016, o Senado aceitou o impeachment, mas não a perda dos direitos políticos da presidente Dilma.
Surgiram muitas críticas, sob o argumento que o texto normativo seria claro que, havendo o impeachment, deve também ser aplicada a pena de perda dos direitos políticos, conforme o texto do parágrafo único do art. 52 da CF:


Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.

Esse resultado seria ou não admitido pela Ciência Jurídica?

Do ponto de vista jurídico, a lei não deve ser interpretada apenas com base no seu texto, mas também levando em conta outros elementos externos.
O impeachment é uma sanção que envolve interesse institucional.
O perda de direitos políticos é uma punição que envolve interesse meramente individual da Dilma.
A gravidade ou a existência de dúvida razoável na tipificação da conduta autorizam o intérprete a fazer reduções interpretativas, quando necessário, mediante um juízo de proporcionalidade.
Veja-se que, por exemplo, a dívida de alimentos anteriores aos últimos três meses de propositura da ação, antes do NCPC (que passou a ter previsão expressa), não admitia prisão civil, apesar de o texto legal não fazer essa ressalva. A jurisprudência, por um juízo de razoabilidade, entendeu ser muito gravosa essa medida.
Note-se também que, no caso de inadimplemento parcial de uma dívida, a medida drástica da resolução contratual não é admitida se já tiver havido pagamento substancial da dívida.
Recorde-se, igualmente, que há condutas que são punidas civilmente, mas não penalmente, ainda que formalmente se encaixem em algum tipo penal.
Lembre-se, outrossim, que há infrações administrativas que não credenciam a inflição das pesadíssimas sanções da improbidade administrativa, embora autorizem penas administrativas mais caroáveis (como uma advertência ou uma suspensão).
Tudo isso decorre de juízos de razoabilidade e dos efeitos jurídicos da dúvida razoável.
Isso vale até dentro das casas: a depende da travessura ou da razoabilidade da dúvida quanto à característica ilícita da conduta, os pais darão uma "broncona", uma "bronca" ou uma "bronquinha" ao filho.
No caso da Dilma, a sua conduta - as famigeradas pedaladas fiscais - foi tida por razoável para defenestrá-la do cargo de presidente (impeachment), mas não para impor uma sanção pesada do ponto de vista meramente individual que a privaria de exercer atividades profissionais de interesse meramente privado (perda dos direitos políticos). A gravidade e o caráter não apodítico da tipificação da conduta justificaram - para os julgadores - a redução interpretativa da Lei.
Essa manobra é - a nosso sentir - plenamente admissível no âmbito da Ciência Jurídica, que se guia pela lógica do razoável, e não pela do racional, na lembrança de Recaséns Siches.

Obs.: não estou emitindo juízo pessoal algum acerca do acerto ou não da decisão do Senado, mas apenas tentando expor que o Direito não se reduz à subserviência à frieza do texto da lei. Direito é texto e contexto.

sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Salve-se quem puder!

Hoje, senti-me como se todos os seres humanos estivessem hipnotizados por alienígenas.
Por onde eu passava, grupos de zumbis humanos ignoravam o que acontecia ao seu redor e, içando a tela luminosa dos seus celulares para diante de seus rostos, mantinham os seus olhos esbugalhados, como a enxergar uma terrível realidade de monstros selvagens.
Fiquei inquieto e curioso.
Eu não via monstro algum.
Será que era eu que estava hipnotizado?
Com audácia, aproximei-me de um grupo fingindo ser também um deles e, ao ver o alvo dos seus olhares, descobri a verdade: os poderosos alienígenas hipnotizadores da humanidade se chamavam Pokémons, e o eficiente instrumento de hipnose era o Smartphone.
Agarrei as mãos da minha maravilhosa esposa e - coração disparado e mãos suadas - joguei meu celular ao céu e corri com ela sem olhar para trás, antes que algum desses Pokémons nos capturasse também.
Não sei o que será de mim amanhã!
Esses Pokémons parecem ser piores do que os terroristas que estão explodindo a Europa.
Carlos E Elias